A solução Temer
por Delfim Netto
O coordenador escolhido pela presidenta Dilma tem larga tradição de eficiência política e administrativa
Marcelo Camargo/Agência Brasil
O poder legislativo parece ter acordado de um longo sono letárgico,
produzido por uma legislação eleitoral disfuncional que inventou o
“presidencialismo de coalizão”. Confrontados com o movimento de reação a esse
estado de coisas por uma saudável mobilização parlamentar interna, o governo e
a sociedade mostram grande perplexidade. Cansada de enrascar-se com amadores, a
presidenta Dilma, em mais um ato de astúcia e humildade inteligente, convocou o
seu vice, Michel Temer, para exercer a função de coordenador político do
governo. Portador de uma longa e larga tradição de eficiência política e
administrativa, Temer é um professor de Direito Constitucional acostumado às
vicissitudes da política que exigem habilidade, paciência e a coragem de
transigir para “coalizar-se”. O seu papel não será o de “domesticar” o Poder
Legislativo, mas de reconhecer a sua saudável independência e harmonizá-la com
os objetivos do Poder Executivo escolhido eventual e majoritariamente pelas
urnas. É preciso insistir que, no regime de eleição de dois turnos, a maioria
que o elegeu é apenas “virtual”, porque não é certo que a maioria “real” o
elegeria. É o caso da presidenta Dilma. Um pouco mais de um terço do eleitorado
a escolheu; um pouco menos de um terço preferia Aécio e um terço votou branco
ou nulo. Recusou-se a entender que no segundo turno não se elege o “melhor”,
mas o “menos pior”, sempre com uma maioria eventual.
O resumo da ópera é que o Supremo Tribunal
Federal tem cumprido o seu papel constitucional com proficiência e que o Poder
Legislativo está resgatando a sua indispensável independência para a construção
de uma República e de uma Democracia sem adjetivos, o que, na prática, é
difícil. Exige paciência e convivência com as “passeatas” e os “panelaços”!
Tudo isso apenas confirma o caminho para a sociedade civilizada, aquela em que
o acidente do nascimento do cidadão tem importância cada vez menor na
perspectiva do seu futuro. Em outras palavras, a organização social, na qual a
igualdade de oportunidade do ponto de partida da vida de cada cidadão é cada
vez maior.
Nada disso gestou a queda do nosso
crescimento econômico nem as dificuldades que estamos vivendo do ponto de vista
fiscal. Essas foram construídas, conscientemente, durante o ano de 2014, por
motivos eleitorais. Em dezembro de 2013, o total dos juros da dívida acumulados
nos 12 meses foi de 5,1% do PIB; o superávit primário, de 1,9% do PIB, o
déficit fiscal acumulado do ano foi de 3,2% do PIB e a relação Dívida
Bruta/PIB, da ordem de 57%. Nada alarmante.
Vê-se com clareza que o desarranjo foi
promovido em 2014. Por quê? Porque durante o ano eleitoral o governo não
admitiu que o crescimento seria próximo de zero, o que todos sabiam desde o seu
início. Ora, até praticamente outubro de 2014, o governo ignorou o fato em suas
revisões bimestrais de receita e despesa. Assistiu à murcha da primeira
(inclusive com desonerações) e estimulou o laxismo da segunda. O resultado foi
uma dramática deterioração fiscal: o déficit acumulado no ano, em dezembro de
2014, foi de 6,7% do PIB com uma despesa acumulada de juros da dívida de 6,1%
do PIB e um déficit primário de 0,6% do PIB, igual à média do primeiro mandato
de FHC! A relação Dívida Bruta/PIB pulou para 64%.
Não adianta discutir. É
hora de apoiar o ministro Levy a levar adiante o “ajuste” fiscal e os ministros
Barbosa, Armando e Kátia para que continuem a estimular a produção e o
investimento. Só a esperança do crescimento tornará o remédio mais palatável.
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