Toda
vez que uma pessoa que nitidamente nunca passou pela dificuldade de não ter
médico no seu bairro, comunidade ou família faz um gesto de ódio ao Mais
Médicos, fico mais orgulhoso do programa que criei e implantei e de toda luta
contra a intolerância, arrogância e descompromisso com os que mais precisam que
empreendi quando Ministro da Saúde do Brasil.
Hoje
os jornais estamparam mais uma vitória do Mais Médicos. A nova etapa mobilizou
apenas médicos brasileiros. Atingimos o universo de mais de 18mil médicos,
atendendo mais de 63 milhões de brasileiros que não tinham médico. Isso foi
possível por dois motivos. Diferente do desejo de alguns, dos cerca de 14 mil
médicos recrutados a partir de 2013 a desistência foi ínfima até 2015. O
segundo motivo é que o programa criado pela minha gestão no Ministério da Saúde
em 2011 (PROVAB), que garante pontos para o concurso de residência
(especialidade) para médicos brasileiros que atendem nas periferias revelou-se
um sucesso e, agora, os inscritos em 2015 foram incorporados ao Mais Médicos.
Em
junho de 2013, o governo brasileiro iniciou uma longa batalha para aprovar a
implantar o programa Mais Médicos. Seu objetivo: levar à saúde para mais perto
daqueles que, por não terem plano de saúde, por não poderem pagar por uma
consulta particular, não tinham direito ao cuidado e ao acolhimento que só o
atendimento médico pode oferecer em um momento de tanta fragilidade como o da
dor, o da doença.
Na
ânsia de afrontar os que mais precisam, a democracia é desrespeitada. A democracia
deve ser exercida para a liberdade. Somos um país democrático também em suas
ideias, em seus anseios. O respaldo do Mais Médicos não é dado por mim. É dado
pelos brasileiros e brasileiras atendidos pelo programa, que antes ansiavam
pela presença de um médico, e por mais de 80% de toda população brasileira.
O
último ato de agressão foi inusitado. Hoje fui convidado para um almoço em um
restaurante no Itaim Bibi (bairro de classe média alta paulistano) com amigos
de infância. São pessoas com quem convivo há mais de 30 anos. Uma amizade que
sobrevive a tudo: distâncias e diferenças futebolísticas e políticas. Os
respeito, convivo, divirto-me com eles tanto como com as outras amizades, que
conquistei ao longo da minha vida profissional em comunidades da periferia e da
Amazônia brasileira e na militância política. Talvez para a repugnância de
alguns e dos detratores da intolerância, sim, tenho amigos da elite econômica
paulistana e outros tantos tucanos, neoliberais e neoconservadores. Parte
disso, pois minha família com muito esforço me garantiu a oportunidade de
convivermos mesmas escolas e estudar na USP e na Unicamp. Divergimos em opções
de vida, profissionais e na política, mas essas amizades sobrevivem apesar do
clima de agressão, desrespeito, ódio e intolerância que alguns buscam aquecer
no país e na nossa cidade.
Tudo
ocorria normalmente quando de súbito um senhor que já se retirava começou a
fazer um discurso, sendo filmado em vídeo pelo seu colega de mesa. Embora tenha
buscado chamar a atenção do salão, talvez imaginando que seria solenemente
aplaudido, foi absolutamente ignorado pelas dezenas de pessoas durante o seu
ato de agressão. Apenas seu colega de mesa o aplaudiu. Após sua retirada, os
garçons, as pessoas de outras mesas e o proprietário do estabelecimento
prestaram solidariedade a mim. Meus amigos, que divergem das minhas posições
políticas, ficaram indignados e certamente terão posições de maior rechaço a
qualquer postura de intolerância, falta de educação e agressividade que alguns
oposicionistas do Mais Médicos ainda alimentam pelo país. Paradoxalmente,
episódios como esse são capazes de despertar cada vez mais as pessoas para que
a democracia possa conviver com a diversidade e a diferença.
Já
é um desrespeito aos meus direitos individuais alguém imaginar que pode me
agredir em público e fazer uso dessa imagem. É um desrespeito ainda maior
quando isso envolve direitos individuais dos meus amigos, que ao contrário do
que pode-se pensar, não possuem nenhuma vinculação partidária nem política comigo.
Essas
agressões não me abalam. Enfrentei alguns colegas de profissão para defender o
Mais Médicos. Pelas pessoas beneficiadas pelo programa, venci preconceitos e
mentiras. Não é qualquer coisa que me deixa perder o rumo e o foco. Muito menos
me faz levantar de uma mesa repleta de amigos. Tão pouco me impressionaria com
um agressor e um aplauso solitários de quem não encara um debate democrático e
prefere a agressão e a fuga.
No
ano passado, percorri todas as regiões do Estado de São Paulo – o que possui a
maior elite econômica, o mais rico do país e o que mais pediu por profissionais
do Mais Médicos desde a primeira fase até hoje . Não foram poucos os
depoimentos de agradecimento pelo programa. Ter a certeza que o Mais Médicos
mudou a vida de milhões de brasileiros é a confirmação de que estamos
melhorando a vida das pessoas, principalmente das que mais precisam, cada vez
mais. Ainda precisamos fazer muito para melhorar a saúde do país. O Mais
Médicos é apenas o primeiro e corajoso passo, dado enquanto fui ministro da
Saúde pela presidenta Dilma, para que a saúde brasileira seja universal.
Posso
deixar alguns frustrados, mas saibam que agressões como essa não me inibem, não
reduzem meu convívio com amigos, sobretudo os não petistas, nem farão com que
eu deixe de frequentar qualquer lugar. Sou feliz por ter amigos no Itaim Bibi e
no Itaim Paulista e gosto muito de cultivá-los. Tenho muito orgulho de ter
criado o Mais Médicos e, como disse, já enfrentei muito mais do que agressor
solitário para implantá-lo.
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