Jurista
diz que conduta de promotor que acusa Lula revela falta de provas
O promotor de Justiça de São Paulo Cassio Conserino procurou a
revista Veja para anunciar publicamente que já teria “indícios suficientes para
denunciar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo crime de lavagem de
dinheiro em investigação sobre um apartamento triplex que tinha sido reservado
pela construtora OAS para a família do ex-presidente”.
A avaliação do promotor do
Ministério Público estadual foi informada pela revista “Veja” na última sexta-feira
(22) no site da publicação.
Na avaliação do doutor em Direito,
também titulado na Alemanha, professor de Direito na Escola Superior do MP do
DF e ex-conselheiro nacional do Ministério Público até o ano passado
(2010-2015), Luiz Moreira, a conduta do promotor paulista revela o contrário do
que ele diz.
Ou seja: ao procurar a
imprensa para fazer essa “denúncia”, além de o promotor Cassio Conserino ter
cometido uma infração funcional também teria deixado claro que não tem nada
contra o ex-presidente. Estaria, pois, apenas em busca de holofotes. E, pior,
em busca de constranger não só o MP-SP, mas, também, o Judiciário paulista.
O Blog entrevistou Moreira
para entender a questão.
*
Blog da Cidadania – o que acha da iniciativa de um promotor paulista de procurar a
revista Veja – notória por seu antipetismo – para afirmar que teria elementos
para acusar o ex-presidente Lula de “lavagem de dinheiro”?
Luiz Moreira – A sociedade brasileira
investiu muito das suas expectativas no Ministério Público. Não é papel da
instituição, portanto, vender revista, vender jornal. Se o promotor de Justiça
tem algum elemento, ele deve se manifestar propondo a ação.
Essa entrevista que ele dá
à Veja tem o único propósito de tumultuar o processo, desprestigiando o
Ministério Público e causando uma pressão sobre o Judiciário. Ele, com isso,
quer criar um fato para justificar sua conduta.
Esse senhor está
colaborando para o desprestígio do Ministério Público e pressionando o
Judiciário para compartilhar a opinião dele. Não cabe ao Ministério Público
vender revista, não cabe ao Ministério Público alardear um feito antes sequer
do oferecimento de eventual denúncia.
Esse tipo de conduta desse
promotor vem sendo absolutamente rechaçada pelo Conselho Nacional do Ministério
Público. Vale informar, aliás, que esse é um tema pacificado no Conselho. Ou
seja: comete infração disciplinar o membro do Ministério Público que, antes de
oferecer uma denúncia, a compartilha com os meios de comunicação.
Esse entendimento do CNMP
decorre de que esse tipo de conduta atrapalha o processo e, assim, é um
desserviço ao Ministério Público e colabora para seu desprestígio. Sem falar
que constrange o Judiciário.
Blog da Cidadania – A conduta desse promotor permite alguma representação contra ele?
Luiz Moreira – Hoje, no Conselho Nacional
do Ministério Público é absolutamente pacífico o entendimento segundo o qual a
conduta desse promotor gera responsabilização administrativa. Isto é, ele vai
responder administrativamente pela conduta despropositada que assumiu.
Ele atuou não como
promotor de Justiça, mas como alguém que está disposto a vender revista.
Blog da Cidadania – E a quem caberia essa representação?
Luiz Moreira – Ao ex-presidente Lula, que é o citado. Ele pode representar
ao Ministério Público de São Paulo. Mas, também, a Corregedoria do MP-SP ou a
do Conselho Nacional do Ministério Público, que pode agir “de ofício”.
Blog da Cidadania – Você diz que a condenação de atitudes como essa desse procurador
já se tornou comum no Ministério Público. Por favor, explique melhor essa
questão.
Luiz Moreira – Sim, é um entendimento
pacífico, ou seja, não há mais divergência no MP de que esse tipo de conduta é
reprovável e punível disciplinarmente. O Conselho Nacional do Ministério
Público tem reiteradas jurisprudências, tem tomado reiteradas decisões que
entendem que um membro do MP só pode falar, só pode dar entrevista após a
propositura de uma ação.
Promotor não pode se
antecipar – como é o caso desse promotor que acusou o ex-presidente Lula –
dando uma entrevista cujo único propósito é chamar holofotes para uma questão.
Nesse caso, nem se sabe se ele proporá mesmo a ação. Pode ser que daqui a uma
semana, um mês, ele chegue ao entendimento de que não há elementos para propor
a ação.
Com essa atitude, o
promotor em questão trouxe um dano à pessoa imputada – no caso, o ex-presidente
Lula – e deslegitimou uma instituição tão importante para nós, sociedade, como
é o Ministério Público.
Então, o que é que o
Conselho Nacional do Ministério Público tem feito? Tem punido esse tipo de
conduta por acreditar que, um, deslegitima a ação da instituição e, dois, cria
atrito com o Poder Judiciário.
Blog da Cidadania – Pelo que deu a entender, independentemente de esse procurador
levar ou não a ação adiante e de ter ou não elementos para tanto, ele cometeu
uma infração ao ir à imprensa antes de apresentar a denúncia e, de qualquer
forma, pode ser punido por isso por ação do prejudicado (Lula) ou das
corregedorias do MP-SP ou do CNMP. É isso?
Luiz Moreira – Exatamente. Esse é um tipo
de conduta que o CNMP tem rechaçado desde a sua fundação. Ou seja, não é papel
do Ministério Público alardear uma ação antes que seja proposta. Ele poderia
propor a ação e, após a propositura da ação, torná-la pública, até para fins de
aprendizado da sociedade.
Nesse caso, não. O único
propósito desse promotor é tumultuar a questão. O que ele pretende com isso?
Ele não é jornalista. Ele não é pago pelo Estado para produzir manchetes e
criar clima político antes de revelar de que elementos dispõe e, com o ingresso
da ação no Judiciário, mostrar que se trata de um caso sério.
Blog da Cidadania – Não dá para acreditar que esse promotor não saiba de tudo isso.
Então, qual é a intenção dele?
Luiz Moreira – Antes de propor a ação,
ele cria uma “onda” na opinião pública. Então, o que é que o juiz que julgará
eventual ação proposta pode fazer? Ao recusar uma ação sem elementos, porém tão
alardeada, o juiz cria uma tensão entre o MP e o Judiciário.
O promotor Cassio
Conserino não está preocupado com isso. Ele quer holofotes, quer aparecer
subindo nos ombros de um ex-presidente da República, o que, por si só, torna
impossível que ele não apareça na mídia.
Blog da Cidadania – Que tipo de elementos contra Lula esse promotor pode ter, já que
ele acusa o ex-presidente de ter “lavado dinheiro” com a compra de um
apartamento que sequer se concretizou?
Luiz Moreira – Ele não tem é nada. O que
ocorre no MP? Quando é que o promotor de Justiça dá entrevista? Ora, para não
atrapalhar a ação ele aguarda, adota uma conduta estritamente técnica, apura o
fato.
E por que ele tem cuidado?
É porque ele não quer que vase nada para não estragar a propositura da ação.
Então, ele guarda recato, propõe a ação e após essa propositura ele se
manifesta publicamente.
O que é que a experiência
tem demonstrado? É que, quando não há fatos, ocorre o que esse promotor fez:
não faz a denúncia, mas ocupa a mídia para ter momentos de fama que suas
investigações não proporcionariam por falta, justamente, de elementos.
Blog da Cidadania – Há que acreditar, portanto, que o Judiciário não embarcará nessa,
certo?
Luiz Moreira – Essa falta de cuidado que
o promotor está revelando tem um significado muito importante, de que não há,
de fato, elementos. E, não havendo elementos, a Justiça agirá de acordo. Se a
denúncia fosse feita sem elementos, como se vê que seria, com ou sem
constrangimento por parte do promotor em questão ela não seria recebida pelo
Judiciário paulista. Por isso, é provável que nem venha a ser feita denúncia
alguma.
É
isso o que revela a atitude desse promotor.
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