Lula, ao NYT: os jovens agora querem mais
16 de Jul
de 2013 | 19:00
Do ex-presidente Lula, em artigo publicado hoje no The New York Times:
Os jovens, dedos rápidos nos celulares, tomaram as
ruas ao redor do mundo.
Seria mais fácil explicar esses protestos quando
ocorrem em países não-democráticos, como no Egito e na Tunísia em 2011, ou em
países onde a crise econômica aumentou o número de jovens e trabalhadores
desempregados a níveis assustadores, como na Espanha e na Grécia, do que quando
surgem em países com governos democráticos populares – como o Brasil, onde nos
beneficiamos atualmente de uma das mais baixas taxas de desemprego de nossa
História e uma expansão sem paralelo dos direitos econômicos e sociais.
Muitos analistas atribuem os protestos recentes a
uma rejeição da política. Eu acho que é precisamente o oposto: eles apontam no
sentido de ampliar o alcance da democracia e incentivar as pessoas a tomar
parte mais plenamente (da democracia).
Esses jovens não viveram a repressão da ditadura militar de 1960 e 1970. Eles não viveram a inflação da década de 1980, quando a primeira coisa que fazíamos quando recebíamos o nosso contracheques era correr para o supermercado e comprar o que fosse possível, antes que os preços subissem novamente no dia seguinte. Eles se lembram muito pouco da década de 1990, quando estagnação e o desemprego deprimiam nosso país. Eles querem mais.
É compreensível que seja assim. Eles querem
serviços públicos de melhor qualidade. Milhões de brasileiros, incluindo os da
classe média emergente, compraram seu primeiro carro e começaram a viajar
de avião. Agora, o transporte público tem que ser eficiente, para tornar a vida
nas grandes cidades menos difícil.
As preocupações dos jovens não são apenas
materiais. Eles querem mais acesso ao lazer e a atividades culturais. Acima de
tudo, eles exigem instituições políticas mais limpas e mais transparentes, sem
as distorções do sistema político e eleitoral anacrônico do Brasil, que,
recentemente, se mostraram incapazes de se reformar. Não se pode negar a
legitimidade dessas demandas, mesmo que seja impossível alcançá-las
rapidamente. É necessário, primeiro, encontrar fundos, fixar objetivos e
estabelecer prazos.
Democracia não faz acordo com o silencio. Uma
sociedade democrática está sempre em fluxo, a debater e definir prioridades e
desafios, em constante busca de novas conquistas. Só numa democracia um índio
poderia ser eleito presidente da Bolívia, um afro-americano ser eleito
presidente dos Estados Unidos. Só numa democracia, pela primeira vez, um
metalúrgico e, em seguida, uma mulher poderiam ser eleitos presidente do
Brasil.
A História mostra que, quando os partidos políticos
são silenciados e as soluções são impostas pela força, os resultados são
desastrosos: guerras, ditaduras e a perseguição das minorias. Sem
partidos políticos não pode haver nenhuma democracia verdadeira. Mas as pessoas
não desejam simplesmente votar a cada quatro anos. Elas querem interação diária
com os governos locais e nacionais, e participar da definição de políticas
públicas, oferecer opiniões sobre as decisões que as afetam no dia a dia.
Em resumo, elas querem ser ouvidas. Isso é um
enorme desafio para os líderes políticos. Isso requer melhores formas de
participação, através dos meios de comunicação social, no local de trabalho e
nas universidades, para reforçar a interação com trabalhadores e líderes
comunitários, mas, também, com os chamados setores desorganizadas, cujos
desejos e necessidades não devem ser menos respeitados porque não tem
organização.
Diz-se, e com razão, que a sociedade entrou na era
digital e a política permaneceu analógica. Se as instituições democráticas
utilizassem as novas tecnologias de comunicação como instrumento de diálogo e
não, apenas, para propaganda, elas passariam a respirar ar mais fresco. E com
isso estariam mais em sintonia com toda a sociedade.
Mesmo o Partido dos Trabalhadores, que eu ajudei a
fundar, e que tem contribuído para modernizar e democratizar a política no
Brasil, precisa aprofundar a renovação. Precisa recuperar suas ligações diárias
com os movimentos sociais e oferecer novas soluções para novos problemas, e
fazer as duas coisas sem tratar os jovens paternalisticamente.
A boa notícia é que os jovens não são conformistas,
apáticos ou indiferentes à vida pública. Mesmo aqueles que pensam odiar a
política estão começando a participar. Quando eu tinha a idade deles, eu nunca
imaginei que iria me tornar um militante político. No entanto, criamos um
partido político quando descobrimos que o Congresso Nacional praticamente não
tinha representantes da classe trabalhadora. Através da política conseguimos
restaurar a democracia, consolidar a estabilidade econômica e criar milhões de
empregos.
Claramente ainda há muito a fazer. É uma boa
notícia que os nossos os jovens queiram lutar para que a mudança social siga em
um ritmo mais intenso.
A outra boa notícia é que o presidenta Dilma
Rousseff propôs um plebiscito para promover as reformas políticas tão
necessárias. Ela também propôs um compromisso nacional para a Educação, a Saúde
e o Transporte Público, em que o Governo Federal dará apoio financeiro e
técnico substancial a Estados e Municípios.
Quando falo com jovens líderes no Brasil e em
outros lugares eu gosto de dizer: mesmo se você perder a esperança em tudo e em
todos, não dê as costas à Política. Participe! Se você não encontrar nos outros
o político que você procura, você pode encontrá-lo ou encontrá-la em você
mesmo.
Luiz Inácio Lula da Silva foi presidente do Brasil
e agora trabalha em iniciativas globais, no Instituto Lula.
Por:
Fernando Brito
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