Por Demarchi
O transformismo perigoso de uma toga
Saul Leblon
O desequilíbrio emocional do relator Joaquim Barbosa
na sessão desta 4ª feira do STF escancara o papel híbrido - e temerário
- assumido por ele desde o início desse julgamento. Barbosa ora veste a
toga de relator, ora de acusador; faz as vezes de juíz e de Ministério
Público, ao mesmo tempo e com igual intensidade. Alterna-se nesse
trasformismo à sua conveniência e arbítrio. Causa constrangimento seu
descontrole. Acima de tudo, preocupa os riscos dessa escalada.
A espiral ascendente desenha uma linha de colisões que
atropela os limites e a liturgia da função, desrespeita a presunção de
inocência dos réus e agride os demais membros do Supremo. Sobretudo o
revisor, no seu papel sagrado de contemplar um segundo olhar sobre cada
linha do processo, tem sido alvo da intolerância dessa toga que se
evoca uma suficiência ubíqua estranha ao Direito - exceto em um
tribunal de exceção.
Em qualquer sociedade onde impera o Estado de Direito,
comportamento assemelhado autorizaria arguir se os extremos dessa
conduta já não teriam resvalado a fronteira do impedimento. Não basta
apenas conhecimento jurídico fascicular. A missão de relator pede
serenidade, equilíbrio e grandeza histórica.
Foi esse o sentido da advertência figurativa feita
pelo cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, quando declarou
a Carta Maior: "A cabeça de um juiz não pode pensar como a de um
taxista" (leia a íntegra nesta pág).
A figura algo caricata que vai se delineando sob a
toga híbrida pode dar razão aos temores mais pessimistas de segmentos
democráticos e ecumênicos da sociedade brasileira, signatários de um
manifesto de ampla adesão nos meios artísticos e culturais.
A volúpia condenatória ameaça a isenção e o
contraditório. São esses os requisitos que diferenciam um julgamento de
um linchamemto, mutação abertamente encorajada por certa mídia, mas que
não pode contagiar o relator, a ponto de ser capturado como personagem
desfrutável de um simulacro de Justiça.
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