sexta-feira, 22 de julho de 2011

Um mundo novo que surge

Eis que, diante de surpresa e pasmo generalizados, sem que suspeitássemos que um dia isso poderia acontecer, as grandes potências mundiais derretem ao sol do verão do hemisfério norte ao sabor de acontecimentos antes privativos dos países do terceiro mundo.

O poderoso “Tio Sam” – democrata dentro de suas fronteiras e imperialista fora delas -, defensor da economia de mercado dentro de casa e, paradoxalmente, protecionista ao extremo, tropeçou em 2008 numa crise que desnudou seu mercado imobiliário e financeiro, derrubou bancos centenários e hoje, tal qual um quatrocentão decadente, nos é revelado como um grande endividado. E nós, brasileiros, novos ricos e ascendentes na nova ordem econômica mundial, estamos na fila dos seus credores! Quem diria… São as voltas que esse mundo de meu Deus dá, sim, senhores.

A China, do alto de sua fortaleza, pede responsabilidade aos Estados Unidos. Quem poderia pensar que aquele gigante territorial, com uma população de 1,4 bilhão de pessoas, conseguisse ter a unidade política, a densidade comercial e a importância econômica para puxar as orelhas de quem, não faz muito, ditava sozinho e a seu bel-prazer os rumos da humanidade? Pois é, aconteceu.

Os chineses estiveram separados do mundo por milênios, ancorados em uma cultura sólida, em crenças profundas, em sabedoria invejável, por uma muralha instransponível e, por último, por um regime fechado e dogmático. Mas, por obra justamente da solidez cultural, da sabedoria que se lhes reconhece, do pragmatismo que esbanjam em tudo o que hoje fazem, transpuseram a muralha ideológica e adaptaram o seu regime. Não são mais dogmáticos, senão pragmáticos. E aqueles simpáticos, desajeitados e tímidos seguidores de Mao, o “grande timoneiro”, que no início dos anos 70 receberam com festas Richard Nixon, precedido pelo abominável Henry Kissinger, como uma tênue deferência à distensão, poucas décadas depois (o que é nada para um povo que pensa em milênios e para o qual o tempo é matéria-prima particularmente íntima), recomendam juízo aos extravagantes gastadores que um dia fundaram uma grande democracia, um grande capitalismo, um grande país, e hoje patinam feio no processo econômico e enfrentam o ocaso com impensável pequenez interna.

Se os norte-americanos não escutarem os previdentes e precavidos chineses, perderão o bonde da história no novo milênio, como perderam a liderança do mundo os orgulhosos súditos de Sua Majestade a Rainha Victória, na virada para o século XX, quando ainda eram os donos do mundo. Fomentando guerras como a da “Tríplice Aliança”, quando o Brasil, Argentina e Uruguai, instrumentalizados e financiados pelo Reino Unido, cometeram um genocídio no Paraguai, dizimando a população adulta, barbarizando uma Nação desenvolvida e reduzindo o maior parque industrial da América do Sul à cinzas, os ingleses cometeram barbaridades aquí e alhures. Na Índia não foi diferente. Eram uma casta esnobe situada acima da casta nativa mais alta. Com olhos de desdém atrasaram os destinos de um país multifacético e invulgar, de cultura singular, hoje baseado em dois pilares: democracia sólida e economia pujante. Os ingleses queriam o chá e as especiarias. Os hindús queriam a liberdade. Hoje os ingleses se vêem às voltas com a atuação facistóide de um magnata apátrida e com o que de pior há na imprensa mundial: o denuncismo impenitente e irresponsável, que condena antes do julgamento e cujos métodos começam a vir a público de forma paradigmática. Hoje os seus antigos colonizados são, nada mais nada menos, uma das potências que deixam os antigos colonizadores comendo poeira no fim da fila da história. A Rainha Victória teria um chilique imenso vendo tudo isso. Cancelaria o chá das cinco com o primeiro-ministro em Buckingham, certamente.

Há países que não eram senão desconhecidos para a grande maioria do mundo. Para os brasileiros, então, nem pensar. Aquele que surge como a grande potência do leste, o parceiro preferencial do Brasil ao lado da África do Sul, Índia e Coréia do Sul, formando os “BRICS”, era, no máximo, a terra do pasteleiro da esquina. Hoje é o mercado promissor, mas também o do presente. A China, a Coréia, a Índia, a África do Sul não são mais “lá longe”. Estão, sim, “logo alí”.


Faz poucos dias vimos a presidenta Dilma Rousseff abrindo os Jogos Mundiais Militares 2011, no Rio de Janeiro. O inigualável craque Edson Arantes do Nascimento, o Rei Pelé, acendeu a pira olímpica, e a Chefe da Nação declarou aberto aquele importante certame. Também vimos Dilma dando início à construção de cinco submarinos, sendo um deles à propulsão nuclear, ao cortar, simbolicamente, a primeira lâmina no estaleiro onde serão fabricados em Itaguaí (RJ). Há dois fatos importantíssimos contidos em tais acontecimentos.
O primeiro é o da maturidade de nossa democracia, posta à prova na última eleição presidencial, quando o PSDB e seus aliados fizeram a campanha eleitoral mais sórdida de nossa história política, com toda sorte de acusações, semeando o terrorismo e o medo, além de uma contra-propaganda absolutamente retrógrada quando não difamatória. Apesar disso, vencemos e Dilma se comporta como é de seu estilo, com altivez e sobriedade. Assumiu o comando das Forças Armadas com naturalidade, com grandeza, e as têm prestigiado ao máximo. Não olha para trás, mas para o futuro, com os olhos de visionária e a plena consciência de sua missão histórica. Não é mulher de ressentimentos, é mulher guerreira e competente, pronta para as missões e os desafios a serem enfrentados e vencidos. Dilma é a presidenta do Brasil do século XXI.

A Petrobrás foi bombardeada à exaustão pelo capital internacional com o apoio de quase todos os partidos políticos, de entidades patronais e de grande parte da imprensa brasileira. As bibliotecas estão aí para quem quiser consultar livros, jornais e revistas e se surpreender com o massacre impatriótico promovido contra aquela que hoje é uma das maiores empresas do mundo! Foi Getúlio, com o apoio de estudantes, nacionalistas e militares, quem a criou, contra vento e maré. Lula mudou o curso de nossa história e recuperou um país que havia quebrado três vezes no governo de FHC. Como se não bastasse, colocou o Brasil como sétima economia mundial, acabou com o desemprego e está no coração do povo. Não teve paz do primeiro ao último dia de seu governo. Fez o que fez, foi o Estadista que a história registra, sem o beneplácito da mesma mídia que festeja o octogenário que nos levou repetida e humilhantemente aos balcões do FMI e hoje ocupa seu tempo num instituto fantasma e na defesa da discriminalização da ‘canabis sativa’ (maconha, para quem não sabe). É o altíssimo preço que pagamos pela ousadia que tivemos de mudar o Brasil para muito melhor.

Há um novo mundo que surge e nele o Brasil tem destaque impressionante. Alguns (o povo, principalmente, que é mais sábio que as elites) captam essas mudanças bem antes. E nesse novo mundo o Brasil não é mais secundário: é protagonista respeitado, senta na mesa principal das discussões, participa das decisões mais importantes.

Escrevo tudo isso para dizer que a história é feita por nós, o povo. Não é feita por Rupert Murdoch. Ele e seus parceiros em todo o mundo a contam durante um certo tempo da forma como querem e bem lhes interessa. Descobertos, publicam uma edição final dizendo “Bye Bye” e a história prosseguirá. Sem eles.



Delúbio Soares é professor

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