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Dalmo Dallari: Um Visionário!
O texto abaixo é do
Jurista Dalmo Dallari. Foi publicado em 2002 quando o Ministro Gilmar Mendes
foi indicado para o STF pelo então Presidente da República Fernando Henrique
Cardoso. E indicava o que estamos vendo hoje deste patético representante do
STF. Leitura imperdível!
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Ministro
Gilmar Mendes "É assim que se degradam as instituições e se corrompem os fundamentos da ordem constitucional democrática." - Dalmo Dallari |
Degradação
do Judiciário
Nenhum
Estado moderno pode ser considerado democrático e civilizado se não tiver um
Poder Judiciário independente e imparcial, que tome por parâmetro máximo a
Constituição e que tenha condições efetivas para impedir arbitrariedades e
corrupção, assegurando, desse modo, os direitos consagrados nos dispositivos
constitucionais.
Sem
o respeito aos direitos e aos órgãos e instituições encarregados de
protegê-los, o que resta é a lei do mais forte, do mais atrevido, do mais
astucioso, do mais oportunista, do mais demagogo, do mais distanciado da ética.
Essas
considerações, que apenas reproduzem e sintetizam o que tem sido afirmado e
reafirmado por todos os teóricos do Estado democrático de Direito, são
necessárias e oportunas em face da notícia de que o presidente da República,
com afoiteza e imprudência muito estranhas, encaminhou ao Senado uma indicação
para membro do Supremo Tribunal Federal, que pode ser considerada verdadeira
declaração de guerra do Poder Executivo federal ao Poder Judiciário, ao
Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil e a toda a comunidade jurídica.
Se
essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que
estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à
corrupção e a própria normalidade constitucional. Por isso é necessário chamar
a atenção para alguns fatos graves, a fim de que o povo e a imprensa fiquem
vigilantes e exijam das autoridades o cumprimento rigoroso e honesto de suas
atribuições constitucionais, com a firmeza e transparência indispensáveis num
sistema democrático.
Segundo
vem sendo divulgado por vários órgãos da imprensa, estaria sendo montada uma
grande operação para anular o Supremo Tribunal Federal, tornando-o
completamente submisso ao atual chefe do Executivo, mesmo depois do término de
seu mandato. Um sinal dessa investida seria a indicação, agora concretizada, do
atual advogado-geral da União, Gilmar Mendes, alto funcionário subordinado ao
presidente da República, para a próxima vaga na Suprema Corte. Além da estranha
afoiteza do presidente -pois a indicação foi noticiada antes que se
formalizasse a abertura da vaga-, o nome indicado está longe de preencher os
requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país.
É
oportuno lembrar que o STF dá a última palavra sobre a constitucionalidade das
leis e dos atos das autoridades públicas e terá papel fundamental na promoção
da responsabilidade do presidente da República pela prática de ilegalidades e
corrupção.
"A comunidade jurídica sabe quem é o
indicado e não pode assistir calada e submissa à consumação dessa escolha
inadequada"
É
importante assinalar que aquele alto funcionário do Executivo especializou-se
em "inventar" soluções jurídicas no interesse do governo. Ele foi
assessor muito próximo do ex-presidente Collor, que nunca se notabilizou pelo
respeito ao direito. Já no governo Fernando Henrique, o mesmo dr. Gilmar
Mendes, que pertence ao Ministério Público da União, aparece assessorando o
ministro da Justiça Nelson Jobim, na tentativa de anular a demarcação de áreas indígenas.
Alegando inconstitucionalidade, duas vezes negada pelo STF,
"inventaram" uma tese jurídica, que serviu de base para um decreto do
presidente Fernando Henrique revogando o decreto em que se baseavam as
demarcações. Mais recentemente, o advogado-geral da União, derrotado no
Judiciário em outro caso, recomendou aos órgãos da administração que não
cumprissem decisões judiciais.
Medidas
desse tipo, propostas e adotadas por sugestão do advogado-geral da União,
muitas vezes eram claramente inconstitucionais e deram fundamento para a
concessão de liminares e decisões de juízes e tribunais, contra atos de
autoridades federais.
Indignado
com essas derrotas judiciais, o dr. Gilmar Mendes fez inúmeros pronunciamentos
pela imprensa, agredindo grosseiramente juízes e tribunais, o que culminou com
sua afirmação textual de que o sistema judiciário brasileiro é um
"manicômio judiciário".
Obviamente
isso ofendeu gravemente a todos os juízes brasileiros ciosos de sua dignidade,
o que ficou claramente expresso em artigo publicado no "Informe",
veículo de divulgação do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (edição 107,
dezembro de 2001). Num texto sereno e objetivo, significativamente intitulado
"Manicômio Judiciário" e assinado pelo presidente daquele tribunal,
observa-se que "não são decisões injustas que causam a irritação, a
iracúndia, a irritabilidade do advogado-geral da União, mas as decisões
contrárias às medidas do Poder Executivo".
E
não faltaram injúrias aos advogados, pois, na opinião do dr. Gilmar Mendes, toda
liminar concedida contra ato do governo federal é produto de conluio corrupto
entre advogados e juízes, sócios na "indústria de liminares".
A
par desse desrespeito pelas instituições jurídicas, existe mais um problema
ético. Revelou a revista "Época" (22/4/ 02, pág. 40) que a chefia da
Advocacia Geral da União, isso é, o dr. Gilmar Mendes, pagou R$ 32.400 ao
Instituto Brasiliense de Direito Público -do qual o mesmo dr. Gilmar Mendes é
um dos proprietários- para que seus subordinados lá fizessem cursos. Isso é
contrário à ética e à probidade administrativa, estando muito longe de se
enquadrar na "reputação ilibada", exigida pelo artigo 101 da
Constituição, para que alguém integre o Supremo.
A
comunidade jurídica sabe quem é o indicado e não pode assistir calada e
submissa à consumação dessa escolha notoriamente inadequada, contribuindo, com
sua omissão, para que a arguição pública do candidato pelo Senado, prevista no
artigo 52 da Constituição, seja apenas uma simulação ou "ação entre
amigos". É assim que se degradam as instituições e se corrompem os
fundamentos da ordem constitucional democrática.
Dalmo de
Abreu Dallari, 70, advogado, é professor da Faculdade de Direito da USP. Foi
secretário de Negócios do município de São Paulo (administração da petista Luiza Erundina)
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