A Globo caminha para a quebra. Se isso acontecer será culpa quase exclusiva de seu Departamento de Jornalismo
J. Carlos de Assis *
É que se alguém quiser se aproveitar da situação para comprar a
Globo encontrará a seu favor o mais arrogante, mais pretensioso, mais insolente
grupo de “formadores de opinião” como nunca se viu antes na história deste
país, e com poderes ilimitados.
Isso porque os donos são ausentes ou incompetentes, e nada trava
a libertinagem televisiva e jornalística que se enfia goela baixo do cidadão
daqui e do exterior, todos os dias, num exercício jamais observado de
manipulação política pela via da emoção.
Há dois patamares no caminho da
Globo para o fracasso:
O
primeiro é o Jornal Nacional,
ligeiramente mais discreto na sua cruzada diária pela desinformação. Conduzido
por William Bonner, que lembra um propagandista de sabonete, traz sempre uma
mistura bem preparada de fatos e emoção direcionada para a busca de
telespectadores a qualquer custo, mesmo quando esse custo significa subverter a
verdade.
A distorção a favor dos ricos é limitada apenas pelo medo de
perder audiência no horário nobre, na medida em que grande parte dela é de
famílias pobres beneficiárias dos programas sociais do PT.
É
no Jornal da Globo,
contudo, que os noticiaristas e comentaristas da Globo saem do armário. Aí a
manipulação da opinião pública passa a ser um jogo aberto. Começa com a figura
burlesca de William Wack anunciando todas as pragas do Egito sobre o Brasil.
Ele tem, como o JN, prazer em noticiar tragédias, coisas que comovem.
Mas, com muitos graus de emoção sobre o Jornal Nacional, despeja
na audiência, formada sobretudo por gente de classe média que não tem
compromisso com horário no dia seguinte, o que essa audiência enviesada quer
ouvir na sua sanha lacerdista de apelos hipócritas contra a corrupção.
Mas William Wack é um casca
grossa: manipula o noticiário de acordo com suas preferências pessoais,
acrescentando ao sabor da notícia deformada esgares de palhaço de circo.
Cabe
a Sardenberg um papel aparentemente mais sutil, como
me observou Jânio de Freitas, o maior jornalista político do Brasil em
atividade, já que ele é mais venenoso por divulgar os
conceitos da economia política favoráveis aos ricos dentro de uma carcaça insidiosa de
neutralidade técnica, como todo bom charlatão. Ele agrada aos poderosos e ao
mesmo tempo engana os pouco pobres que resistem a assistir a tevê até de madrugada.
O Jornal da Globo tem, portanto, uma interação intelectual e
moral afetiva com ricos e poderosos. Sua eficácia, conforme Marx, está no fato
de que a ideologia da sociedade é a ideologia da classe dominante.
Quando a classe dominante dispõe inteiramente da mídia, sem
concorrência – porque, no campo da ideologia, a quase totalidade dos maiores
jornais, revistas e tevês está do lado e de mãos dada com uma direita sórdida e
indiferente aos destinos da sociedade -, o campo político fica inteiramente aberto,
inclusive para golpes brancos.
Poderia continuar enchendo laudas e laudas de adjetivos contra a
dupla do Jornal da Globo e contra outra dupla igualmente perniciosa para a
democracia, os comentaristas do jornal Globo Míriam Leitão e Merval Pereira.
Este não merece muita tinta, porque é apenas ignorante – na
acepção semântica da palavra. Míriam, porém, como Sardenberg, é astuta. Passa a
ideia de que sabe economia, quando o que realmente sabe é identificar
economistas de direita, como ela, e dar-lhes espaço franco em sua coluna diária
e sórdida na Globo News.
O noticiário econômico brasileiro, de jornal e de tevê, está
dominado por entrevistas e artigos de economistas de banco. Galbraith, com sua
fina ironia, dizia que não se sentia à vontade para acreditar em opiniões
econômicas de quem tem interesse próprio em jogo.
A rede Globo e os jornalões, assim como as revistas semanais
(exceto Carta Capital), apoia seu noticiário econômico em economistas de banco
com o maior descaramento. Assim, são os economistas de banco que estão fazendo
a cabeça de milhões de brasileiros sobre economia.
Trabalhei anos na editoria econômica do Jornal do Brasil, de que
fui subeditor, e jamais entrevistei um economista de banco. Trabalhei anos como
repórter econômico da Folha de S. Paulo e jamais entrevistei, para publicação,
um único economista de banco. Agora são esses economistas que dominam o
noticiário econômico com seus próprios interesses.
Acaso é esse tipo de liberdade de expressão e de opinião
publicada que interessa ao Brasil? Ou é o momento em que se deve pensar em
dividir o monopólio do Globo e fomentar um novo jornal no Rio para o Brasil?
P.S. Não é do meu estilo fazer ataques pessoais. Entretanto, o
Sistema Globo foi dividido em três capitanias, uma para cada herdeiro, e as
capitanias em sesmarias, cada uma sob o comando de um jornalista no caso do
Departamento de Jornalismo.
Assim, não adianta falar, quando se trata de formação de
ideologia, de um sistema global. É preciso identificar pessoalmente os donos
das sesmarias jornalísticas, como procurei fazer. Não fosse tão grande o Sistema
Globo, amainaria minhas críticas. Como é grande demais, e eu muito pequeno,
pode perfeitamente suportar o choque!
*Jornalista e economista,
doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 20 livros
sobre a Economia Política brasileira, dos quais o último é “A Razão de Deus”.
(via CartaMaior
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