Nos primeiros dias de
fevereiro, diminuiu consideravelmente o contingente dos que não acreditam na
possibilidade de a direita midiática tentar derrubar a presidente Dilma
Rousseff. Alguns fatos recentes foram decisivos para esse despertar da
consciência quanto ao ímpeto golpista que se assanhou de forma tão explícita no
período indicado.
Para ter ideia de
quanto cresceu o nível de radicalização dos derrotados na eleição presidencial
do ano passado, faça uma experiência: digite no Google, entre aspas, as
seguintes expressões: “impeachment de Dilma” e “impeachment de Lula”.
Eis, abaixo, o
resultado que obterá.
Esse comparativo se
torna espantoso quando se lembra que o governo Lula passou pelo dramático
escândalo do mensalão, no qual houve tentativa de envolvê-lo que se imaginava
forte. Comparando com o que estão fazendo com Dilma, porém, percebe-se que o
ex-presidente acerta quando diz que “nunca viu” fazerem com alguém o que estão
fazendo com a sua afilhada política.
Mas os motivos para
essa maior consciência sobre a ameaça golpista são bem mais concretos do que
pode indicar essa eloquente consulta ao “oráculo” da era digital. Vamos a eles.
1 – Vitória do
peemedebista Eduardo Cunha, inimigo declarado do governo, para a Presidência da
Câmara. Essa vitória ocorreu em franca hostilização ao Palácio do Planalto e
reuniu uma maioria massacrante daquela Casa – 375 deputados, número mais do que
suficiente para decretar o impedimento da presidente da República.
2 – Cogitação
insistente da tese pró impeachment na grande imprensa. No jornal Folha de São
Paulo, por exemplo, entre 31 de janeiro e 6 de fevereiro os termos Dilma e
impeachment apareceram todo dia, em 17 matérias. Antes disso, haviam aparecido
juntos pela última vez, naquele jornal, só em 29 de dezembro do ano passado.
3 – Fernando Henrique
Cardoso, José Serra e o ex-vice-governador tucano de São Paulo Alberto Goldman
previram e/ou pediram impeachment da primeira mandatária da nação.
4 – O ex-presidente
tucano chegou a encomendar um “parecer jurídico” ao conhecido jurista
antipetista Ives Gandra Martins, que, por óbvio, deu parecer favorável, ainda
que tal parecer tenha sido condenado por um grande número de juristas, que
chegaram a qualificá-lo como mera peça política.
5 – A espetaculosa
operação da Polícia Federal que conduziu coercitivamente o tesoureiro do PT,
João Vaccari, para prestar depoimento, com direito a um vídeo malandro gravado,
obviamente, pelos próprios policiais e divulgado, maliciosamente, como se
Vaccari tivesse oferecido resistência, quando, na verdade, os policiais pularam
o muro da casa dele ainda de madrugada, antes de tocarem a campainha para
comunicá-lo de que teria que acompanhá-los.
6 – Expectativa de
queda da popularidade de Dilma, que, se ocorrer, sinalizará à oposição e à
mídia que há “clima” para golpe, ainda que o fato de não sair pesquisa sobre o
tema desde o ano passado sugira que essa tão almejada queda de popularidade
pode não ter ocorrido por enquanto, apesar de a presidente ter passado o mês de
janeiro sob artilharia de todos os lados.
De todos esses
fatores, porém, o que parece ter indignado mais o PT é o espetáculo montado
pela Polícia Federal para conduzir Vaccari para depor. Lembra, em muito, o
golpe que policiais deram na candidatura Lula em 1989, quando vestiram
camisetas do PT nos sequestradores do empresário Abílio Diniz.
O caso é
especialmente grave porque, de todos os que foram presos na tal Operação My
Way, só Vaccari teve seu nome exposto na imprensa, apesar de ter sido levado
somente para depor, sem acusação formal da Justiça, enquanto que aqueles que
foram PRESOS tiveram seus nomes preservados. Tudo isso a 24 horas da
comemoração dos 35 anos do PT.
Foi no âmbito desse
quadro de golpismo explícito que o PT se reuniu em Belo Horizonte na última
sexta-feira para comemorar o aniversário do partido. No evento, a presidente
Dilma, mais uma vez, falou sobre todos os ataques que seu governo vem sofrendo.
Além de defender a Petrobrás, explicou medidas impopulares que adotou
recentemente e pediu à militância de seu partido que reaja.
Evidentemente que
Dilma pode falar quanto quiser que a mídia só irá reproduzir o que lhe
interessa. O mesmo se dá com Lula. Todas as críticas que ambos fizeram à
manipulação de informações contra o governo e contra o partido do governo
obviamente que, se saírem, será só na imprensa escrita, que ninguém lê.
Alguns dirão que
Dilma poderia usar rede nacional de rádio e tevê para se defender, mas o fato é
que os pronunciamentos dessa natureza são reservados para o governante
comunicar fatos de interesse da população, não para fazer política, mesmo que
seja para se defender. Eventual uso desse meio, neste momento, daria margem
para Eduardo Cunha fazer uma das suas, agora que tem poder para tanto…
Porém, a fala mais
contundente do evento supracitado foi a de Lula. Sobretudo quando improvisou
antes de proferir discurso escrito, que justificou por não querer falar “tudo o
que pensa” sobre o que estão fazendo com o seu partido.
Confira, abaixo, a
improvisão de Lula antes da leitura de seu discurso.
“A gente fica mais indignado do que outros dias e a gente então tem
que ter muito cuidado para não repassar aqui, nessa festa de 35 anos, a indignação
que eu fiquei ontem, porque seria muito mais simples a polícia federal ter
convidado o nosso tesoureiro para se apresentar do que ir buscá-lo em casa.
Seria muito mais simples dizer que eles estão repetindo o mesmo ritual
que eu vejo acontecer nesse Brasil desde 2005, quando começaram as denúncias
que eles chamaram de “mensalão”. Toda quinta-feira (…) começa a sair boato; na
sexta-feira sai a denúncia, é publicada pelas revistas, sai na televisão; no
sábado, continua saindo na televisão; no domingo, massacre pela imprensa e, na
segunda-feira, começa um outro assunto para, na semana, começar tudo outra vez.
É um ritual que está se repetindo. Na campanha, a companheira Dilma foi
vítima disso como poucas vezes eu vi alguém ser. E a utilização, pela mídia, não
é o critério da informação. Porque nós achamos que tudo que acontece no país
tem que ser informado, mas o critério adotado pela mídia brasileira é o da
criminalização do Partido dos Trabalhadores desde que nós chegamos à
Presidência.
Eles trabalham com a convicção de que é preciso criminalizar o nosso
partido. Não importa que seja verdade ou não verdade, o que interessa é a
construção da versão para se construir uma narrativa.
Então, eu pensei: se eu for falar tudo o que eu penso vai ser muito ruim
porque vão dizer que eu estou aqui falando com o fígado, e eu não quero
prejudicar o meu fígado com 69 anos de idade (…)”
A fala de Lula tem um
significado que vai além das palavras proferidas. Não é o que foi dito, é quem
disse. E quem disse foi alguém que tem forte influência, e até ascendência, não
apenas sobre o PT, mas sobre os movimentos sociais e sindicais que vêm torcendo
o nariz para Dilma, sobretudo após a escolha de ministros que desagradaram
esses setores.
Por mais que cogitem
que Lula não tenha hoje a força política que tinha ontem, Lula ainda é Lula.
Sob seu comando – se é que cabe o termo – CUT, MST e até a UNE, entre muitos
outros movimentos sociais, ficarão ao lado da legalidade, ou seja, do mandato
constitucional e legítimo obtido por Dilma Rousseff em 26 de outubro do ano
passado.
Esse fato novo – Lula
estava calado, como Dilma – insere um elemento vital na equação golpista. A
menos que a próxima pesquisa sobre a popularidade da presidente revele uma
queda muito acentuada, o fator Lula servirá como elemento dissuasório. E mesmo
que a queda de popularidade seja pronunciada, com Lula no jogo a direita sabe
que haverá reação que poderia não haver sem que ele se dispusesse a liderá-la.
Por fim, a liderança
de Lula terá forte efeito sobre a militância independente do PT, que vinha
demonstrando irritação com a falta de reação do partido, da presidente e até do
próprio ex-presidente. Sob o comando deste, veremos até simpatizantes do PT
indo à rua defender a legalidade, se necessário.
Fonte
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