Grupos vendem direita como o novo
Jorge Chaloub ao ser entrevistado por um jornal paulista:
A direita "envergonhada"
pós-ditadura se renovou?
Jorge Chaloub - O grupo heterogêneo da "nova
direita" reúne tradições de pensamento distintas, que atuam conjuntamente,
como versões extremas do liberalismo e novas feições do conservadorismo. Esses
novos grupos e atores possuem continuidades com grandes líderes da direita
brasileira, como Carlos Lacerda, mas também revelam descontinuidades.
Quais as características dessa nova
direita?
Como escrevi em texto com Fernando
Perlatto, apesar das diferenças entre grupos e atores, é possível apontar
pontos em comum. Um primeiro é a clareza em se afirmar como pertencente à
direita, algo que não se fazia.
Outro é a centralidade de um discurso moral,
dividindo o mundo entre bem e mal. Por isso, todas as posições que se
assemelhem à esquerda são retratadas como patologias, como exposto pelo termo
"esquerdopata".
Por fim, o conservadorismo moral é
combinado com adesão ao liberalismo econômico, permitindo a aliança entre
certos grupos neoconservadores e neoliberais.
Por que a adesão é aparentemente
crescente?
Entre as causas, merece destaque a
articulação político-institucional dos grupos, em parte organizada em torno de
"think tanks" [organizações que produzem conhecimento] com vínculos
com o empresariado e a mídia. Também contribui sua capacidade de renovar a
linguagem e aproximar-se de um público desconfortável com a cena política
tradicional, organizada em torno do centro. Há uma preocupação em construir um
discurso esteticamente mais atraente, que se vende como novo.
Que consequências podemos observar
com essa reorganização ideológica?
O cenário político atual testemunha a
crise de uma esquerda influente desde a redemocratização, que se vê abalada
após o golpe parlamentar sofrido por Dilma Rousseff. A nova direita contribuiu
para a ruptura institucional, ao mesmo tempo que tem protagonismo na construção
de um clima contrário às esquerdas. A esquerda procura caminhos, entre os quais
movimentos de secundaristas merecem destaque.
Em que medida os governos petistas
colaboraram com a ascensão da "nova direita"?
As limitações e virtudes do projeto
petista, assim como as insatisfações naturais de um longo período à frente do
poder, estimularam ideários direitistas. Por outro lado, o discurso de novidade
- antes uma autoimagem que algo efetivo - dessa nova direita teve cenário
propício em virtude de sentimento de fastio perante as instituições.
A ascensão de grupos evangélicos na
política está associada à reorganização da direita?
A ascensão dos evangélicos, que também
constituem grupo muito diverso, é anterior. Há, por certo, afinidades em
relação a algumas pautas morais, assim como alianças em torno de temas e
inimigos, sobretudo os identificados com o campo da esquerda.
Uma possível hipótese apontaria para a
construção de um cenário mais propício a certos grupos evangélicos com essa
onda conservadora. Mas o processo de atuação não se reduz a isso.
O que projeta para a eleição
presidencial de 2018?
A Lava Jato confere incerteza ao pleito.
A pouca clareza dos critérios do Poder Judiciário, crescente, torna o cenário
turvo. Sem falar na instabilidade do governo Temer, que não se sabe se
resistirá.
O cenário se revela propício para alguém
que se venda como um salvador externo à política tradicional. Empresários e
egressos do mundo jurídico são boas apostas.
Jair Bolsonaro, favorável à ditadura
militar, parece se beneficiar da reorganização ideológica no país. Por quê?
Parte da "nova direita" se
mostra elogiosa à ditadura. Bolsonaro constrói seu discurso em consonância com
esses argumentos, como a centralidade da moral, o antiesquerdismo, o orgulho em
se reivindicar de direita, a virulência no argumentar e a adesão a teorias
conspiratórias. Não parece competitivo, mas a incerteza impede previsões mais
seguras.
Jorge Gomes de Souza Chaloub
é Doutor em Ciência Política pelo IESP-UERJ, com doutorado-sanduíche na École
des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), possui graduação em Direito
pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2006) e mestrado em
Teoria do Estado e Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro (2009). É atualmente professor da Escola de Ciências Sociais
do CPDOC-FGV e da Faculdade de Direito do IBMEC-RIO. Foi professor substituto
dos departamentos de Ciência Política da UFRJ e Direito da UFF. Atua nas áreas
de Teoria Política, Pensamento Político-Social Brasileiro, Filosofia Política,
Teoria Social, História do Brasil Contemporâneo e Sociologia do Direito.
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