O Mais Médicos cansou de apanhar da mídia e achou uma saída.
por Leandro Fortes
................................Mais Médicos no Oiapoque, cuidando de índios
À frente,
há três anos, da Organização Pan-americana de Saúde (Opas) no Brasil, o
dentista cubano Joaquin Molina (foto à esquerda) não se surpreendeu quando, há dois anos, o
Conselho Federal de Medicina encabeçou uma violenta reação ao programa Mais
Médicos, do governo Federal. “É um tipo de reação corporativista comum em todo
o mundo”, explica, diplomático. “Não houve surpresa, é como uma demarcação de
território, por causa da chegada de estrangeiros”.
A surpresa, diz Molina, foram as
manifestações de racismo e preconceito contra os médicos cubanos. “De repente,
passaram a dizer que eles não pareciam médicos, mas trabalhadores domésticos,
porque eram negros, que por isso deveriam voltar para a África”, lembra.
Uma cena lamentável tornou-se um
emblema dessa sanha levada a cabo por grupos de médicos em todo o País: em
agosto de 2013, logo depois de chegar ao Brasil, o médico cubano Juan Delgado,
de 49 anos, negro, foi vaiado e chamado de “escravo” por colegas de
jaleco brasileiros, em Fortaleza, no Ceará.
A participação da Opas e, especificamente, de Joaquin Molina, na montagem e na
operação do Mais Médicos foi fundamental para o sucesso do programa. Lançado em
8 de julho de 2013 pelo governo federal para suprir a carência de médicos nos
municípios do interior e nas periferias das grandes cidades brasileiras –
rincões para onde médicos
brasileiros, historicamente, sempre se recusaram a ir trabalhar.
Por isso mesmo, tanto a Opas quanto Molina foram os primeiros a serem acusados,
junto com o então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, do PT, de montarem um
esquema para, na verdade, injetar dinheiro em Cuba.
Como era de se esperar, tanto a Opas, criada há 110 anos, dos quais, há mais de
50 no Brasil, quanto Molina, se tornaram alvo da mídia. A circunstância, no
entanto, não parece alterar o permanente bom humor do cubano. “O problema é
que, no Brasil, a mídia é muito apegada às más notícias”, avalia. “Não há
manchetes positivas no noticiário, tudo vai pelo lado negativo”.
Por isso, de certa forma, pelo menos no que diz respeito ao Mais Médicos, a
Opas desistiu de se comunicar com a população por meio da mídia tradicional e,
agora, pretende usar
mais os blogs e as redes sociais. “Nunca vi um projeto tão relevante, tão
importante para um país como o Mais Médicos, mas o debate em torno dele ficou
muito poluído pela política”, diz Joaquin Molina.
Assim, a instituição tem preferido despachar agentes internos de comunicação
para muitas das zonas remotas onde atuam os profissionais do Mais Médicos para
produzir vídeos e reportagens a serem veiculados na interface brasileira do
portal da Opas (www.paho.org/bra) e, daí, passados adiante nas redes sociais.
Nada de coletivas nem viagens com jornalistas previamente pautados para falar
mal do programa, não importa a realidade com a qual eles sejam confrontados.
Responsável pelo convênio que trouxe 11.429 mil médicos cubanos para o Brasil
(o programa tem 14.182 mil profissionais), a Opas passou a ser tratada pela
mídia como uma espécie de mercadora de escravos, a partir de uma tese abarcada
pelo CFM e reverberada pela oposição, com a ajuda de sociopatas de plantão nas redes
sociais.
A tese da escravidão cubana se baseia no fato de que, da bolsa de 10 mil reais
contratada pelo governo brasileiro, os cubanos têm direito a parte dela, 3 mil
reais. Os outros 7 mil reais vão para o governo de Cuba, de acordo com o
convênio firmado pela Opas, uma ação que só pode ser entendida a partir da
realidade da ilha caribenha. O salário médio mensal de um médico em Cuba é de 60
dólares (180
reais). No Brasil, portanto, ele ganha, hoje, cerca de mil dólares –
mais de 16 vezes do que ganharia em Cuba. Além disso, os municípios arcam com
todas as despesas de transporte, moradia e alimentação dos profissionais
cubanos trazidos pelo Mais Médicos.
Escapulir da mídia e investir na comunicação em rede ainda é uma experiência
embrionária, e o exemplo da Opas pode servir de inspiração para outras
entidades colocadas no pelourinho da imprensa por questões políticas,
ideológicas ou, simplesmente, mercadológicas. Quando não pelos maus
bofes da oligarquia midiática.
O sucesso do programa expôs a deformação da maioria dos médicos brasileiros,
acostumados a números e prontuários de hospitais, mas pouco afeitos ao convívio
humano, base da medicina de atenção básica, segredo do sucesso dos médicos cubanos em todo
o mundo.
Mas, ao que parece, a lição foi aprendida. A próxima fase do Mais Médicos irá
colocar outros 4.058 profissionais nos rincões e periferias das grandes
cidades, mas nenhum deles será cubano.
São brasileiros
que, apesar da mídia e dos detratores arregimentados por ela, conseguiram
enxergar uma realidade que mudou a vida de 30 milhões de pessoas em 3.785
municípios atendidos. Destes, 400 nunca tinham tido médicos. Mesma situação dos
34 distritos indígenas, atualmente atendidos por 300 médicos cubanos.
Mas isso, você não vai ver
na mídia.
Leandro
Fortes é
jornalista, professor e escritor. Trabalhou para o Jornal do Brasil, O Globo,
Correio Braziliense, Estadão, Revista Época e Carta Capital.
desta quinta, por
Célvio Brasil Girão. Ele é cearense, engenheiro agrônomo, servidor público federal aposentado, 68 anos, casado, quatro filhos e onze netos.
ATENÇÃO: as palavras na cor vermelha constam originariamente no texto, mas os destaques são deste BLOGUEIRO.
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