quarta-feira, 22 de março de 2017

Faca e queijo na mão. Ou é só ter cuidado para não cortar na própria carne ! ! !

Faca e queijo na mão. Ou é só ter cuidado para não cortar na própria carne
Por Zeca Peixoto

Encerrei na noite desta segunda-feira, 20/03, monitoramento, mediante software, das últimas 50 postagens das páginas “Vem pra rua” e “Movimento Brasil Livre”, ambas no Facebook. Duas das mais expressivas entidades ciberativistas da extrema-direita brasileira. Estes grupos estão convocando a população para manifestação no próximo domingo, dia 26/03. O MBL tem 2.002.081 seguidores; o VPR conta com 1.504.849. A pauta é tão difusa quanto o nível dos debates em ambas fanpages.
“Fim do forum privilegiado”, “Moralização da política” “Reforma alternativa da Previdência” e até “Fora Temer”. Nas discussões, muitos dos principais protagonistas lançam mão de termos chulos, xingamentos e não há a mínima concatenação de ideias ou o que possa se equivaler a um debate com algum nível de discernimento. A Rede Globo é chamada de “petista” por alguns militantes (Não é para rir, é verdade). No mais, as mais díspares e fantasiosas “análises” da conjuntura nacional.
Embora seja uma amostragem limitada, porém expressiva, o que este quadro pode apontar? O grupo político que apeou a presidenta Dilma da Presidência, em Setembro do ano passado, hoje se posta entre a cruz e a caldeirinha. Se naquele momento havia certa consonância de ações e narrativas entre estas entidades e a grande imprensa, empreendendo um efeito-catraca discursivo que foi capaz de construir o imaginário da necessidade do golpe, hoje o quadro é bem diverso.
A despeito do agendamento noticioso intermitente da Operação Carne Fraca, desencadeada pela Polícia Federal, que tem baratinado discussões e toma amplo leque político, da direita à esquerda, encampando teorias conspiratórias e que tais – este é um assunto para um futuro comentário -, o que se observa na disputa narrativa é o recuo destrambelhado do discurso da militância de direita.
Na página do VPR, por exemplo, o ator Cláudio Lins, que não tem maior visibilidade, publicou um vídeo convocando a população para “protestar” contra o forum privilegiado, sem no entanto explicar o mérito da questão. Já o líder do MBL, kim kataguiri, aparece num outro vídeo defendendo uma proposta “alternativa” de Reforma da Previdência. Desesperado intento de segurar militantes insatisfeitos com o projeto de lei encaminhado pelo Palácio do Planalto.
Registra-se claro deslocamento das agendas. A grande imprensa busca, como sempre, culpados de ocasião para o escândalo da carne, que envolve uma cadeia produtiva em torno de US$ 15 bilhões e da qual ela faz parte – e, não se enganem, os “culpados” logo serão absolvidos por estes pools de mídia; já os movimentos extremistas de direita se perdem nas pautas e enredam-se em xingamentos “contra a política”, se voltando, em boa medida, contra esta mesma imprensa outrora aliada; e o discurso do Planalto não consegue ganhar os grandes players que dia desses eram parceiros siameses no golpe parlamentar de 2016.
É o momento das narrativas das esquerdas buscarem, o máximo possível, unificar os discursos. Ser inteligente o suficiente para entender o tabuleiro político-midiático e avançar com pautas unificadas.
Há espaços.
Os empresários do agronegócio logo hão de se entender, a despeito da deblaquê momentânea do setor agroexportador pecuário, que certamente elevará o número de desempregados.
Se foi uma conspirata ou não encetada pelo mercado internacional do segmento, é questão a ser debatida sem perder a perspectiva de outras que têm efeitos muito mais deletérios a médio e longo prazo. As propostas das reformas da Previdência e Trabalhista estão neste momento nubladas pela agenda da carne de papel.
Pelo que foi monitorado nestas páginas, a direita vai às ruas no domingo sem qualquer discurso que engaje. E tende a ser um estrondoso fracasso. Diante dos episódios dos dias 15 e 19/03, é preciso incrementar a contra-ofensiva. Diria que é tarefa imperativa.
O quadro favorece.
A grande imprensa se desvela em atender seus públicos e até vai às cordas quando o Fantástico é obrigado a noticiar a manifestação vermelha que reuniu, segundo o Corpo de Bombeiros da Paraíba, entre 90 e 100 mil pessoas no Cariri paraibano. Ficou refém das redes sociais no que, de fato, se constituiu no primeiro comício de Lula à Presidência em 2018.
A extrema direita, por sua vez, busca desesperadamente uma tábua narrativa para segurar o estouro da boiada nas suas hostes depois dos estragos perpetrados pelo governo de Michel Temer, a quem virou as costas. Quer tirar da cartola cantarolas que não mais empolgam. Estão sem pautas que aglutinem.
À esquerda, fica a tarefa de ocupar amplo espaço deixado pelo bate cabeça de um governo frágil e uma extrema-direita que se mostra encolhida e perdida. O fôlego do 15/03 e do 19/03 tem que ser ampliado. Mas, para isso, é preciso entender a colcha dos retalhos narrativos e fazer o tricor com maestria.
Não existe vácuo em política, bom lembrar.

Nenhum comentário: