Verissimo e o golpe: “Teve
cara de golpe, cheiro de golpe e penteado de golpe – mas há controvérsias”
Escritor Luis Fernando Verissimo

Papai Noel
Acabou não sendo nem uma questão política nem uma questão jurídica,
mas uma questão semântica. Afinal, o que o governo Dilma fez foi crime ou não
foi crime? Na interpretação da acusação, foi crime imputável (horrível palavra)
evidente. Para a defesa, não foi. Os argumentos dos dois lados eram incisivos e
coerentes. No fim, a escolha foi entre dois tipos de histrionismos, já que era
tudo teatro mesmo — e, no fim, não fez a menor diferença, pois os 61 senadores que
imputaram (desculpe) a Dilma e os poucos que estavam a seu favor já tinham a
cabeça feita. Foi golpe ou não foi golpe? Outra questão semântica. Teve cara de
golpe, cheiro de golpe, penteado de golpe — mas há controvérsias.
Me preocupo muito com o Leigo, essa simpática figura de retórica que
nunca sabe nada de nada. O Leigo deve estar se perguntando como é que advogados
e economistas que se criaram no mesmo lugar, foram amamentados da mesma maneira
e estudaram nas mesmas escolas (fora alguns que passaram por Harvard) chegam a
conclusões tão diferentes, todas baseadas nos mesmos números, nos mesmos fatos
e na mesma Constituição? Como é — deve estar pensando o Leigo — que a Dilma é
imputada por práticas não ortodoxas e proibidas, mas que não impediram outros presidentes
de praticá-las no passado, impunemente? Por que o Tribunal de Contas da União
acordou do seu sono profundo para examinar as contas da Dilma, depois de
ignorar as contas de todos os governos do Brasil desde as do Getúlio Vargas?
Inclusive as do Juscelino, pai do reinado das empreiteiras? O pobre do Leigo
cada vez entende menos.
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