Antes de mais nada, queria fazer um
agradecimento público ao governo Michel Temer. E creio que não falo apenas
por mim, mas por muitos de meus colegas jornalistas, independentemente do
posicionamento ideológico, time de futebol ou credo de cada um de nós.
Vocês sabem como pode ser difícil para os profissionais que
monitoram o poder público encontrar um fato novo todo o dia, analisa-lo e
divulga-lo. Não raro, a notícia surge apenas depois de longas
investigações ou depende da boa vontade de atores do poder público que detém
tais informações. Foi assim com os casos de corrupção envolvendo os governos do
PT e do PSDB, por exemplo.
Agora, não mais. Tem sempre declaração bizarra de ministro por
aí que surge feito Pokemón na esquina, quando a gente menos imagina.
É ministro criticando a universalidade do SUS e dizendo que
homens procuram menos atendimento de saúde porque trabalham mais que as
mulheres, ministro dizendo que vai mudar a jornada de trabalho e reduzindo
horas extras, ministro antecipando operações da Lava Jato para os migos… Mesmo
que faça sol, é certeza que choverá groselha ou comportamento mirim.
Em entrevista à rádio
Jovem Pan, ontem (26), o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu
Padilha, afirmou:
''O comunicador-mor do governo tem que ser o presidente. Aí a
população olha para o presidente e vê nele… O nosso sistema presidencialista
tem um pouco de paternalismo… Vê no presidente um pouco do que foi o imperador,
um pouco do que foi, lá atrás na monarquia, alguém que tinha condições de
definir o rumo da vida das pessoas.''
Tá vendo? Agora me diz se tem como um jornalista não agradecer?
E Padilha ainda reafirmou: ''Aonde falo, falo conforme as
palavras do presidente Michel Temer''.
Lembrar é viver: em entrevista ao jornal O Globo, Michel
Temer havia dito que, quando despacha em sua mesa e ela tem todos os assentos
ocupados, sente-se como o imperador Carlos Magno:
''Eu me sinto aqui como Carlos Magno. Quando eu tinha 11 anos de
idade, eu ganhei um livro chamado “Carlos Magno e os 12 cavaleiros da Távola
Redonda” e eu li aquele livro e era assim: os 12 cavaleiros.”
Claro, ele misturou as histórias do imperador europeu, que viveu
entre os anos 742 e 814, e a Távola Redonda – lendária mesa redonda em torno da
qual sentaram-se valorosos cavaleiros da corte do não menos lendário (ou
fictício) rei Artur.
É fascinante a tara do Palácio do Planalto pela ideia de
Michel, imperador.
O que seria um prato cheio para algumas sessões de psicanálise.
Quais os desejos reprimidos de Michel que estão sendo relegados
ao inconsciente e explodem, aqui e ali, em declarações à imprensa dadas por ele
ou seus subordinados?
Se pedíssemos para que ele relaxasse e fizesse um exercício de
livre associação, o que lhe viria à mente? Catapultas, cavalos, castelos,
cruzadas, empalamentos?
Gosto dos políticos bem soltinhos, falando bastante. Mas fico preocupado
que os falhos presidenciais, que aparecem na forma de exemplos à imprensa, não
costumam envolver a democracia e a república.Fonte:
É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e o desrespeito aos direitos humanos no Brasil. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão.
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