Foto: Sandro Lima
suor sagrado
é bem mais belo que esse sangue amargo e
tão sério/
... então me abraça forte ...
A PROPÓSITO DO DISCURSO DA MINISTRA APARECIDA GONÇALVES
Por
Tutmés Airan é Desembargador e Coordenador das Coordenadorias da Mulher e dos Direitos Humanos do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas.
Anualmente, celebramos com o “Agosto Lilás” o aniversário da Lei Maria da Penha, que este ano completa 17 anos. Aqui em Alagoas, no encerramento dessas celebrações, contamos com a presença da Ministra das Mulheres, a querida companheira Aparecida Gonçalves, cuja trajetória de vida se confunde com as mais generosas lutas das mulheres brasileiras nas últimas décadas.
Citando os dados do Anuário
Brasileiro de Segurança Pública, em seu provocante discurso, a ministra lembrou
que, no Brasil, em 2022, os feminicídios cresceram 6,1%, resultando em 1.437
mulheres mortas simplesmente por serem mulheres.
Seguindo a sua ode veemente
contra a misoginia, a Ministra Aparecida destacou o escândalo do exponencial
aumento dos registros de assédio sexual e da importunação sexual, na ordem de
49,7% e 37%, respectivamente, e, por fim, completando esse quadro que nos
remete ao inferno de Dante, a Ministra apresentou ainda a assustadora
informação de que, em 2022, diariamente, 673 mulheres se deslocaram até uma
delegacia de polícia para registrar boletim de ocorrência sobre agressões
ocorridas no ambiente doméstico ou decorrentes dele.
Se é verdade que a violência
de gênero deita profundas raízes na sociedade machista e patriarcal brasileira,
é igualmente verdadeiro que há dois fatores primordiais e complementares: o
desfinanciamento das políticas de proteção à mulher por parte da gestão de Jair
Bolsonaro, que registrou a menor alocação orçamentária em uma década para as
políticas de enfrentamento à violência contra a mulher, e o estímulo aos crimes
de ódio, com a ascensão de movimentos ultraconservadores misóginos na política
brasileira, os quais recrudesceram essa violência no Brasil.
Será que só essa Ministra
percebe a gravidade da violência contra as mulheres em nosso país?
Interpelou-nos, em um brado indignado, Aparecida Gonçalves.
Cara Ministra, a sua verve
potente, nas terras de Aqualtune, não pode deixar de ecoar para além da
indignação momentânea. A partir dela, inspirada na ideia lançada da marcha
contra a misoginia, assumo um desafio/compromisso público, e para o qual espero
a companhia de outros braços.
O desafio que proponho
objetiva superar o sentimento de fadiga, de insuficiência, e por que não dizer,
de fracasso, que muitas vezes nos assola, seja no Poder Judiciário, seja no
Ministério Público, seja na Defensoria Pública, nas Polícias Civis e Militares
e nos órgãos do Poder Executivo encarregados pelas políticas públicas para as
mulheres.
É uma sensação de que o
esforço cada vez maior que fazemos para proteger a vida das mulheres não tem
servido nem ao menos para estagnar o recrudescimento da violência de gênero.
Os problemas estruturais da
sociedade brasileira, a exemplo do patriarcado, da misoginia, do racismo, do
machismo que alimentam a violência de gênero, amplificados pelo governo
Bolsonaro, exigem uma resposta interinstitucional, interseccional, integrada e
sustentável, superando as emergências, as respostas isoladas, tópicas e
meramente reativas.
Porque a vida de cada mulher
verdadeiramente importa, estou propondo, publicamente, aos Chefes dos Poderes
Executivo, Judiciário, Legislativo, do Ministério Público e da Defensoria Pública
a construção de um Plano Estadual Intersetorial e Interssecional de Prevenção e
Enfretamento à Violência Contra as Mulheres e Meninas, em cooperação mútua com
o Ministério da Mulher e da ONU Mulheres Brasil e com a necessária participação
das entidades e movimentos de mulheres alagoanas.
O “Agosto Lilás” findou,
todavia, as condições estruturais que permitem uma das piores expressões da
banalização do mal, para usar uma expressão cara à filósofa alemã e judia,
Hannah Arendt, consistente na naturalização da violência epidêmica contra as
mulheres e meninas, a qual segue presente na sociedade alagoana e brasileira.
Não há tempo a perder, ao contrário do refrão da bela música da canção popular brasileira, NÃO TEMOS TODO O TEMPO DO MUNDO!"
Um magistrado/mestre de sensibilidade RARA (opinião deste rapadureiro)
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