O
Brasil que brota para ver Lula
POR FERNANDO BRITO
02/09/2017
Fiquei em dúvida se ilustrava o post com a foto aí de cima ou com a
que vai no corpo do texto, ambas do Ricardo Stuckert, que virou uma espécie de
Debret desta “missão francesa” de um nordestino pelo Nordeste, à procura de si
mesmo e de força para rebrotar, como uma planta busca água em suas raízes.
Escolhi porque nela há uma criança, que não merece ter, daqui a 50
anos, a expressão que a outra mulher tem no rosto crestado de sol e de
carências.
As duas são de Marcolândia, ponto mais alto da Chapada
do Araripe, onde Lula esteve ontem e ontem se falou aqui que era gente e
gente num deserto que só tem perto uma pequena comunidade de 8 mil
habitantes.
Acertei no deserto e errei no “perto”.
Porque era longe, longe, “um lugar ermo, um descampado longe da
cidade, sem uma árvore para abrigar as pessoas, debaixo das gigantescas pás das
torres geradoras de energia eólica”, conta no Facebook o advogado,
jornalista e poeta piauiense Odorico Carvalho, que ponho para contar a
história:
“A
Caravana chegou com 3 horas de atraso. Ao passar por Araripina, em Pernambuco,
uma multidão interrompeu o comboio e Lula teve que descer, tirar fotos, receber
beijos, abraços, como vem acontecendo ao longo dos 9 estados nordestinos.
Achava-se que não haveria público em Marcolândia em razão do local escolhido. Mas as pessoas foram surgindo do mato, das estradas, em motos, bicicletas, à pé e foram se acotovelando em frente ao palco protegendo a moleira com cartazes, com as mãos espalmadas, do jeito que fosse possível.
Ao chegar, Lula foi ovacionado aos gritos pelo povo, com o pipocar de fogos e a alegria de quem se vê, frente a frente, pela primeira vez, com o herói da classe trabalhadora, o homem que salvou milhares de vidas irremediavelmente condenadas à morte pela fome e pela pobreza. Se o local escolhido foi para evitar o povo, erraram: o povo compareceu em massa.
Maria Kazé, líder do MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores, fez um discurso comovente, com o destemor de quem já viveu tudo, já enfrentou tudo e venceu. Lula ouviu calado. Depois fez brincadeiras com o nome do prefeito local, Zé Pitú, falou grosso contra os golpistas e jogou indiretas para a imprensa nacional que, segundo ele, acompanha a Caravana, mas não publica nada.”
Achava-se que não haveria público em Marcolândia em razão do local escolhido. Mas as pessoas foram surgindo do mato, das estradas, em motos, bicicletas, à pé e foram se acotovelando em frente ao palco protegendo a moleira com cartazes, com as mãos espalmadas, do jeito que fosse possível.
Ao chegar, Lula foi ovacionado aos gritos pelo povo, com o pipocar de fogos e a alegria de quem se vê, frente a frente, pela primeira vez, com o herói da classe trabalhadora, o homem que salvou milhares de vidas irremediavelmente condenadas à morte pela fome e pela pobreza. Se o local escolhido foi para evitar o povo, erraram: o povo compareceu em massa.
Maria Kazé, líder do MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores, fez um discurso comovente, com o destemor de quem já viveu tudo, já enfrentou tudo e venceu. Lula ouviu calado. Depois fez brincadeiras com o nome do prefeito local, Zé Pitú, falou grosso contra os golpistas e jogou indiretas para a imprensa nacional que, segundo ele, acompanha a Caravana, mas não publica nada.”
Não, Odorico, não publica porque este povo não existe, não existe
senão quando brota da terra seca.
Brotar como drama, n’O Quinze, da Rachel
de Queiroz, ou nas Vidas Secas, do
Graciliano, é florada de curta duração: vai logo às prateleiras, pegar pó, para
só voltar a ser visto por poucos, daí a uma geração, que vão achar que é coisa
passada, que não existe mais.
E existe, existe.
Mas brotar como festa, brotar como esperança, brotar como desejo é
coisa mais forte, que não se apaga, que vira fé, lenda, “causo” de raiz
plantada na memória das gerações. De raiz tão funda que, mesmo quanto se
corta, salga e maldiz, ainda assim rebrota.
Por toda a parte, como Odorico relata, sai da terra quando a
caravana segue.
“A Caravana
seguiu para Picos PI, onde, neste sábado, haverá um grande evento no bairro
Pantanal. E nós fomos atrás bem perto das viaturas da Polícia e outros veículos
com seguranças da comitiva. Em Alegrete, uma multidão tomou a pista e Lula, de
novo, desceu do ônibus para receber os amassos de sempre. Ao chegar a Campo
Grande, de novo, lá estava a multidão à espera. Já beirando as 14 horas, usei
uma pista lateral, consegui me desvencilhar da carreata e segui viagem,
enquanto, pelo retrovisor, vislumbrei a multidão em volta de Lula em mais um
gesto de amor quase inexplicável pelo velho líder trabalhista. “
A planta do deserto – que Brizola dizia ser, aquela que
rebrota com qualquer chuvinha, desta que há seis anos falta
ao Nordeste – é o povo nordestino, resistente como uma mulher
sofrida, luminoso como menina que brota linda como a flor do mandacaru,
que o Gonzagão cantou, não por acaso, no “Xote das Meninas”:
“Mandacaru,
quando fulora na seca/ É sinal que a chuva chega no sertão.
A chuva vai voltar, a despeito dos sabidos, que preferem crer só em
isóbaras e anticiclones dos metereologistas da crônica política, que acham que vem
de Curitiba um El Niño fatal.
São todos racionais e frios; talvez por falta de amor não saibam se apaixonar.
Pode ser inexplicável, mas para que explicar o que é um milagre do
povo destes que mesmo quem é ateu têm de crer, como o Caetano, porque “não
cessam de brotar, nem cansam de esperar”, porque “o coração que é soberano e
que é senhor, não cabe na escravidão”.
Cabe, não.
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