“Eu tô cansado, mas tô feliz da vida. Esse é o cansaço da batalha, da labuta, não é o cansaço da preguiça. E se eles querem me derrubar, que venham pra rua”. A fala do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva marca o fim de uma jornada de 21 dias, de uma intensa viagem a mais de 30 cidades, cortando pela estrada os nove estados nordestinos. Uma viagem que, como lembra o ex-presidente, não foi contada nas páginas dos jornais.
A caravana, que tocou milhares de corações das capitais aos
sertões, foi o reencontro de Lula com o Brasil
que ajudou a construir.
De Pernambuco, de onde saiu ainda menino aos 7 anos de idade para
fugir da seca e da fome, a Salvador, onde o Brasil começou e por onde o ex-presidente
deixou um legado que inclui a criação da Unilab (Universidade da Integração
Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira) – na qual foi patrono de uma turma
de formandos brasileiros e africanos.
Para Lula, a criação da universidade é parte do pagamento da dívida
histórica dos brasileiros com o continente africano.
Aos 71 anos, o ex-presidente não se intimidou pelas horas de
estrada, e nem mesmo pela rouquidão – Lula chegou a fazer oito discursos em um
dia – e a agenda pré definida sucumbiu à vontade do povo, que ao saber da
passagem da caravana Lula Pelo Brasil, organizava paradas improvisadas, na esperança de conhecer um
nordestino que deixou o sertão, mas que dele não se esqueceu.
A etapa nordestina da caravana Lula pelo Brasil tem uma simbologia
especial. Remeteu a um Brasil que superou a miséria e a fome e ampliou o acesso
a universidade. Em 21 dias, cinco títulos de Doutor Honoris Causa foram
concedidos ao torneiro mecânico sem diploma que veio a se tornar o Presidente
da República que mais criou universidades no país. Somaram-se aos de Salamanca,
de Coimbra, e mais 27 instituições e hoje são 34.
Faltou um. Suspendida por decisão judicial, a cerimônia que entregaria
o 35º título a Lula na UFRB (Universidade do Recôncavo Baiano) não ocorreu. “E naquele mesmo dia uma negra quilombola estava se
formando doutora na universidade. Esse é meu título”, comemorou Lula.
“O que eu tenho orgulho? Hoje o Nordeste tem 1 milhão e 600 mil
jovens na universidade. São 20% dos universitários no país. Pela primeira vez,
mais do que a região Sul. O mesmo Nordeste que era conhecido pelo analfabetismo
e pela evasão escolar”, disse Lula, durante o encerramento da caravana em São Luís,
no Maranhão.
O último ato de Lula no
Maranhão reuniu mais alguns milhares de pessoas, a exemplo das multidões
atraídas pela caravana.
“Essa caravana mexeu
com o coração do povo brasileiro, apesar da grande imprensa não ter noticiado”,
pontuou o ex-presidente, ao agradecer a hospitalidade do povo nordestino que
recebeu Lula de braços abertos, por todos os lugares onde passou. Prefeitos,
governadores e os movimentos sociais e sindicais também foram lembrados pelo ex-presidente, que
agradeceu a dedicação à caravana.
“Eu comecei a caravana em
um encontro com trabalhadores do Metro, foi uma das coisas mais emocionantes da
minha vida. Eu que lidei com trabalhadores a vida toda, eu nunca vi pessoas com
tanta esperança de recuperar o país quanto os trabalhadores que me receberam
naquele dia”, disse Lula, ao relembrar a chegada a Salvador no dia 17 de
agosto.
Esperança foi o tom
da caravana Lula Pelo Brasil. Esperança ao povo que deixou a fome para trás e
que agora não deve aceitar a sombra do retorno da miséria. “A fome não leva à
revolução, leva à submissão. Porque a pessoa não tem força sequer pra lutar.
Daí o pobre não se organiza em partido, em sindicato”, frisou Lula, que se
tornou o presidente responsável por tirar o Brasil do Mapa da Fome da ONU.
Lula encerrou a caravana
com um recado e uma convocação. ‘Pra ser respeitado o Brasil precisa gostar de
si mesmo. Ninguém pode perder a esperança. Se eles pensam que o problema é o
Lula, é bom eles tirarem o cavalo da chuva. Porque nós já temos milhões e
milhões de pessoas que pensam como o Lula”. Ontem mesmo, Lula retornou a São
Bernardo do Campo.
Última parada de uma viagem histórica
Na manhã do último
dia de jornada, o ex-presidente Lula visitou, acompanhado do governador do
Maranhão Flávio Dino, o Porto de Itaqui. Desde as 17h, o povo
ludivicense e de toda a região de São Luís se reuniu na Praça Dom Pedro II, no
centro histórico da capital maranhense. A rica cultura do estado marcou presença para
animar o público, com muito tambor de crioula e outras manifestações da cultura
popular.
“Saímos dia 17 da Bahia e estamos completando 20 dias na estrada
conversando com o povo e dialogando com nossa gente. O presidente Lula
conversou sobre vários temas, transporte, educação, desenvolvimento regional, políticas
de combate à seca. O planejamento tinha 25 cidades, mas paramos em 60 cidades.
Hoje, vocês, no estado do Maranhão, vão fazer a festa mais bonita de
encerramento da caravana”, disse Marcio Macedo,
coordenador do projeto Lula Pelo Brasil e vice-presidente nacional do PT.
Lula recebeu de uma comissão de deputados estaduais o título de
cidadão maranhense e a medalha de honra ao mérito da Assembleia Legislativa.
Representantes da Fetaema (Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras da
Agricultura do Estado do Maranhão) e do MST (Movimento dos Sem Terra) presentearam
o ex-presidente com uma cesta de produtos da Reforma Agrária.
Fabiana e Eliana Guajajara, representando os povos indígenas da
etnia Guajajara, presentearam Lula com um cocar típico. Marquinhos
Monteiro, compositor e militante do MST, cantou a música Sim,
Eu Posso, sobre a luta contra o analfabetismo. A histórica música
“Lula Lá”, que embalou a campanha de Lula em 1989, foi lembrada.
O governador do Piauí Wellington Dias (PT),
afirmou: “Nós queremos lutar pelo direito de sonhar. Sem respeitar nossa
situação, através de um golpe, quiseram
afastar esse sonho do povo brasileiro. Estamos indo a praça pública por onde
anda pra dizer ‘Eu quero minha esperança de volta’. Os jovens, as mulheres, os
negros, querem o direito de seguirem sonhando e de serem tratados com
dignidade”.
João Pedro Stedile, líder do MST, exaltou grandes maranhenses da história, mas
afirmou: “outros maranhenses que andam por aí, nem o diabo quer eles”, e fez um
duro discurso contra o que ele chamou de “judicialização” do poder do povo na
figura do ex-presidente Lula.
Flávio Dino: “Esse país é racista
sim, e temos que lutar contra isso”. O governador maranhense Flávio Dino (PCdoB),
que se destaca a nível nacional com a expressiva melhora nos índices sociais no
estado, foi muito aplaudido. “Temos uma mensagem muito importante, essa cidade,
capital do Maranhão, fará 405 anos. Deus nos mandou essa lua maravilhosa e
estamos aqui olhando palácios, a Igreja da Sé, e a pergunta que vem é: ‘quem
foi que construiu esses palácios, a riqueza do Brasil?’ Foram os negros, os
índios, povo mais pobre, mas estranhamente esse país desenvolveu um ódio contra
os mais pobres. Esse país é racista sim, e temos que lutar contra isso”,
afirmou, lembrando a revolta popular da Balaiada.
Flávio Dino também louvou a
presença do grande maranhense Manoel da Conceição. E encerrou: “quero falar do
futuro. Nós temos como falar com o povo pobre. Vou cuidar dessa luta no
Maranhão que é grande, mas não se esqueça: todas as vezes que o senhor precisar
pode contar com o povo do Maranhão”.
Manoel da Conceição,
fundador do PT no Maranhão, entregou a Lula a bandeira do Partido dos
Trabalhadores que passou simbolicamente pelos presidentes do PT no nove estados
nordestinos durante a jornada. Lula começou a falar, com a voz de quem fez
incontáveis falas durante os 20 dias, e foi interrompido pelos gritos de “olê.
Agradeceu os governadores Flávio Dino e Wellington Dias,
os senadores Paulo Rocha(PA)
e Humberto Costa (PE),
os deputados federais estaduais e “a cada mulher e a cada homem presente nessa
praça, os movimentos sociais, o MST, a CUT, a Contag e todas as centrais que tiveram
uma dedicação em cada estado”.
Lula lembrou de cada parada da
caravana #LulaPeloBrasil
“Termino a caravana muito grato a todos os companheiros dos
movimentos sociais que não apenas acreditaram, mas fizeram acontecer apesar da
grande imprensa não ter dado nenhuma notícia durante os 20 dias. Quero
agradecer as mães e irmãs que trouxeram companheiros e companheiras com
dificuldades de locomoção”.
Lula afirmou que o “velho guerreiro, sempre jovem” Manoel da
Conceição “foi um guerreiro durante a construção do nosso partido no estado do
Maranhão”.
Lembrou que o primeiro ato
da caravana foi o ato com os trabalhadores do metrô em Salvador. “Foi
emocionante para mim que a vida inteira lidei com os trabalhadores, na
indústria, no movimento sindical”.
“Precisamos recuperar o país para não voltarmos aos tempos em que o
pobre era tratado como cidadão de segunda categoria. O povo brasileiro agora
sabe que é bom ter acesso a educação, emprego, renda”, afirmou.
Lembrou o programa “Luz
Para Todos”, que custou R$ 20 bilhões, mas “tirou milhões de brasileiros das
trevas e os colocou no século 21”.
“Depois pra Bahia fui pra Sergipe, Alagoas, chegada em Penedo foi
apoteótica, recebi o título em Lagarto (SE), Arapiraca (AL), fui pra Recife,
Rio Grande do Norte, Ceará, voltei pro Pernambuco, fui pro Piauí, cheguei aqui
no Maranhão. Tô cansado, mas esse é o cansaço da luta. Venham pra rua me
enfrentar. Se querem prender corrupto, já apreenderam na casa do Geddel malas
cheias de dinheiro. Na sua frente, que foi juiz federal, se eles pegarem na
minha vida um real de desvio venho aqui pedir desculpa pra vocês. Quero que
eles tenham coragem de um dia pedir desculpas pra mim”
Lula: “Caráter a gente não compra”
Lula lembrou da origem humilde, mas que formou seu caráter. “Nasci
em Garanhuns, fui comer pão com sete anos. Com 13 anos, minha mãe oito filhos
estava já em São Paulo, muitos dias não tinha sequer feijão pra por na panela,
e minha mãe, que nunca foi de reclamar, sempre disse que o dia seguinte ia ser melhor.
Foi daí que tirei meu otimismo. Ia fazer admissão, passei na barraca da feira e
o brasileiro não comia maçã, tinha a maçã importada da Argentina, embrulhada no
papelzinho, falava ‘vou pegar uma’ e certamente o dono da barraca não mataria
como hoje mata, e não pegava por que não queria envergonhar a minha mãe. Será
que agora eu vou mentir e envergonhar a memória da minha mãe? Se eles
inventaram mentira pra me julgar e agora tão enrolados na mentira problema
deles”.
“Quero olhar nos olhos de vocês, e é nos olhos que a gente fala a
verdade, tinha 73 testemunhas e o promotor que disse que o PT era uma
organização criminosa não apareceu em nenhuma audiência. Não quero julgar
ninguém, mas se esse promotor tiver um pingo de responsabilidade terá que pedir
desculpas. O que mais me inquieta é que o pessoal da Lava Jato estão reféns da
Rede Globo, porque mentiram tanto e o William Bonner não pode falar ‘Boa noite,
queremos pedir desculpas ao senhor Luiz Inácio Lula da Silva’. Caráter a gente
não compra, a gente nasce e morre com ele”,
“Hoje, ao terminar essa caravana, penso que quando esses palácios
foram construídos ninguém imaginava que hoje estaríamos aqui lutando pela
democracia, pela constituição, para ter um presidente da república que entende
a alma do nosso povo, que pensa a sociedade com sua mega diversidade”,
completou.
Lula lembrou que muitas vezes, deitado com sua saudosa Marisa, se
perguntava o que fez de errado para merecer a perseguição de que é alvo. “Meu
erro é que pela primeira vez na história desse país, quando ganhei as eleições
fiz um discurso muito simplório, falei: ‘se cada criança mulher e homem tiver
tomando café, almoçando e jantando todo dia já realizei o sonho da minha vida’.
Por que dei tanta importância ao combate à fome? Porque eu sabia o que era a
fome. O que é ser tratado como se fosse um número, porque o homem não tem força
pra se organizar, fica em casa. A fome não leva à revolução, leva à submissão,
porque o pobre não tem força sequer pra lutar.
Ele afirmou que a democracia que quer é diferente da democracia da
elite. “Você só pode gritar que tá com fome, mas não pode comer, gritar que
quer escola, mas não pode estudar, e é isso que o Temer está destruindo. É
muita petulância dar à empregada doméstica direitos, ela poder comprar um perfume,
querer que um jardineiro queira comprar o mesmo carro do dono do jardim,
colocar um menino e uma menina negra pra fazer mestrado, doutorado, que o filho
do pedreiro seja engenheiro, que o filho do coveiro possa ser diplomata. Eu não
quero tirar nenhum rico do banco da escola, quero por o rico do lado dele”.
“Eles não admitem
que saímos de R$ 2 bilhões para a agricultura familiar em
2003 para R$ 30 bilhões quando a Dilma saiu. Eles não podem admitir que eu sou
o único presidente sem diploma universitário e sou o que fez mais universidade
nesse país. Em Santo Domingo em 1507 tinha universidade, e no Brasil só foi
criada em 1922, não por causa do povo, mas por causa do Rei da Bélgica que
vinha pro Brasil e precisava ter um título honoris causa. Por que o filho deles
iam estudar nos Estados Unidos, na França, na Inglaterra. Somente no século XXI
conseguimos universalizar mas as escolas eram de má qualidade”, afirmou.
“Um dia esse país será exportador de
conhecimento”
Lula exaltou um exemplo de um senhor de 66 anos que acabou de se
alfabetizar para mostrar que o povo deve querer sempre mais. “O povo quer comer
carne de qualidade, uma picanha no churrasco com a cervejinha gelada. O povo
não quer roupa de terceira qualidade, quer viajar, andar de avião. Quando o
pobre começou a andar de avião eles começaram a chamar aeroporto de rodoviária.
Tenho orgulho de termos
saído em 8 anos de 3 milhões para mais de 8 milhões de jovens na universidade,
e é pouco. Temos que saber que um dia esse país será exportador de
conhecimento, inteligência, não exportador de commodities”.
O ex-presidente lembrou ainda que há pouco tempo o Brasil era
respeitado internacionalmente. “Em dezembro de 2002, o presidente Bush me
convida, mas fui antes pra Argentina e o Chile. O Bush começa a falar do Saddam
Hussein, do Bin Laden, terrorismo. Falou uns 40 minutos, presidente Lula
preciso do Brasil. Eu tava nervoso, um metalúrgico, no salão oval, da Monica
Lewinsky, não entendia uma palavra em inglês, falei: ‘meu país fica a 14 mil
quilômetros daqui, não conheço o Saddam, minha guerra não é a sua, minha guerra
é contra a fome’.
O Brasil tava devendo US$
30 bilhões pro FMI, falei pro presidente quero pagar a dívida, não quero ficar
devendo. Vocês não sabem o orgulho que eu tive quando a gente não devia mais
nada e ainda emprestamos US$ 10 bilhões na crise de 2008.
O Brasil era respeitado, e
agora é tratado como se fosse nada. Esse Trump não tem o menor respeito pela
América Latina e pelo Brasil, e o Brasil só vai ser respeitado quando a gente
se respeitar”.
“Fiz essa caravana para falar com mulheres, ouvir meninas
agradecendo por que fizemos universidade. Queria que todo governante desse país
fizesse caravana, que abraçasse essas pessoas com cheiro de poeira, com cheiro
de sonho, que falaram estamos perdendo as coisas que conquistamos, eu dizia não
podemos perder a esperança, vocês jovens, não percam a esperança, achando que
esse congresso não presta. Quando não acreditarem mais em ninguém vocês
precisam entrar na política. Tenho pena do povo brasileiro. Me preocupa o que
eles estão fazendo com o futuro de vocês, dos nossos netos, a gente não pode
permitir que um jovem perca a esperança de entrar na faculdade, que uma mãe não
possa sonhar em ter uma casa e uma profissão”.
Lula encerrou, como sempre, com uma mensagem de esperança e de que
só há saída com o povo em primeiro lugar. “Eu não sei o que vai acontecer
comigo, mas se eu puder ser candidato vai ser pra ganhar, pra provar que o
metalúrgico é capaz, eles sabem que somos capazes, e a capacidade não é do
Lula, é do povo brasileiro. Se eles pensam que vão conseguir tirar o Lula,
podem tirar o cavalo da chuva, por que já temos milhões de pessoas que pensam
como o Lula. Tinha um homem que queria a independência, juntaram um grupo, e
mataram todos, mas tinha um chamado Tiradentes. Eles mataram, esquartejaram, salgaram
a carne e colocaram no poste para ninguém pensar em Independência, e 30 anos
depois teve a Independência, e o Tiradentes virou herói. Quero ver o que vão
falar da gente daqui a 30, 100 anos”.
“O Lula hoje
representa uma ideia, a ideia de que o povo pode, merece, quer viver bem.
Aquela frase do Obama ‘nós podemos’ pode ser nossa. Não queremos mais morar na
senzala, queremos morar na casa grande. Temos direitos e vamos brigar. Se essa
elite não pode fazer, não se escondam atrás de mentiras, façam uma eleição pra
gente mostrar. Levo daqui a cara dos brasileiros, é por essa senhora aqui, esse
portador de deficiência, essas crianças, que quero dizer, eles que se cuidem
por que vamos voltar a governar esse país, esse povo vai voltar a governar esse
país. Boa noite a todos!”.
Fontes:
https://www.facebook.com/Lula/posts/1426972817371714
Lula Pelo Brasil
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https://www.facebook.com/Lula/posts/1426972817371714
Lula Pelo Brasil
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