Com sua candidatura, Lula corta o papo furado
"Não bastasse toda uma vida e uma longa trajetória
politica, não tivesse ele sido presidente por oito anos e permanecido ativo na
política nos últimos dez anos, Lula não faz hoje um gesto sequer para ser
considerado um Bolsonaro à esquerda", escreve o Presidente
do Instituto Vox Populi, o sociólogo Marcos Coimbra
A
formalização da candidatura de Lula a presidente em 2022 fez um grande bem à
política brasileira. Vários bens.
Um deles foi diminuir a conversa fiada, as ilusões,
fanfarronices e hipocrisias que são despejadas diariamente sobre nós. A
presença de Lula na eleição areja o ambiente e limita a mentirada.
Tome-se
o Judiciário. Até para não desesperar, muita gente quis encontrar méritos em
alguns dos indicados pelo capitão, como o substituto de Celso de Mello no
Supremo Tribunal Federal e o Procurador-Geral da República. Chegaram a
elogiá-los.
Depois
que Lula virou candidato, no entanto, viu-se que era ilusão. A primeira coisa
que Bolsonaro fez foi cobrar por suas nomeações e o comportamento recente de
ambos mostra que não passam de delegados do bolsonarismo, prontos a dar
piruetas para oferecer respaldo jurídico ao que o chefe quiser.
Até
o ano que vem, vamos nos acostumar a um Judiciário com militantes na defesa do
capitão e seus planos, o que só irá piorar com mais um ministro do STF a ser
indicado ainda em 2021. Não contente em rebaixar o nível político, intelectual
e moral do Executivo, o ocupante do Palácio do Planalto avança contra o sistema
de Justiça, agora às claras.
O
medo que Bolsonaro sente de Lula produziu, no entanto, um resultado positivo:
fez com que ele se precipitasse na exibição de um apoio nas Forças Armadas que
não tem, menor do que aquele de que se jactava. A manobra da demissão do
ministro da Defesa não foi a demonstração de força que buscava. Ao contrário, o
episódio explicitou que os militares não o abandonaram, mas sugere que não
estão dispostos a endossar um golpe de estado para entronizá-lo, venha de
dentro das Forças Armadas ou de outro lugar.
O
capitão pode insistir que o Exército é dele, mas não é o que o próprio diz e é
bom para o país constatar que essa conversa não passa de fanfarronice. Foi o
pavor de Lula que, paradoxalmente, o levou a expor sua fraqueza, o inverso da
imagem que buscava.
Outra coisa que ficou evidente depois da formalização da candidatura
do ex-presidente é a hipocrisia da tese da equivalência entre radicalismos de
sinal trocado, mas iguais.
Insistir na tecla de que Lula e Bolsonaro se equivalem no extremismo é uma das maiores mentiras de nossa história política.
Desde
que Lula reassumiu seu lugar, falou por dezenas de vezes com os principais
jornais e veículos de comunicação do mundo. Deu coletivas e esteve à disposição
da imprensa brasileira e só não conversou com quem não o quis ouvir. Em nenhuma
dessas oportunidades, revelou-se o tal radical que inventaram.
Não
bastasse toda uma vida e uma longa trajetória política, não tivesse ele sido
presidente por oito anos e permanecido ativo na política nos últimos dez anos,
Lula não faz hoje um gesto sequer para ser considerado um Bolsonaro à esquerda.
Esse, por sua vez, se afunda mais a cada dia na estupidez, autoritarismo e
truculência, mais se mostra um projeto de ditadorzinho de terceira,
incompetente e falastrão.
A hipocrisia de muita gente não tem limite. Como os editorialistas da “grande imprensa”, os comentaristas e os expoentes do “jornalismo profissional”, sem qualquer compromisso com a realidade. A ficção do Lula extremista é conversa para boi dormir e, na maior parte dos casos, serve apenas para justificar um bolsonarismo envergonhado.
Pior talvez seja a hipocrisia de algumas lideranças políticas. Essas que pretendem se apresentar como um hipotético “centro democrático”.
Não
se discute o direito de qualquer pessoa ter opiniões e acreditar em preceitos
que, mundo afora, são chamados “de centro”. O que é ridículo é gente madura,
com boa formação intelectual, inventar que o Brasil precisa evitar dois
radicalismos, quando há um só que é incompatível com a democracia e a
civilização: o ultra direitismo tosco de Bolsonaro e sua gangue.
Muito provavelmente, à medida em que o tempo passar e o Lula real voltar a ser mais familiar para o conjunto da opinião pública, fique óbvia a hipocrisia de coisas como o manifesto dos “pré-candidatos de centro” e os artigos de Fernando Henrique Cardoso. Seria muito bom que, junto com as ilusões e as fanfarronices que vão diminuindo, esses aí deixassem de ser hipócritas.
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