Paulão: Uma Convenção contra o racismo estrutural brasileiro
Em fevereiro, em meio à
profusão de notícias funestas, fruto da necropolítica que caracteriza o governo Bolsonaro, mês que o Brasil ultrapassou a espantosa a marca de 250 mil mortos
por coronavírus, o Congresso Nacional promulgou a Convenção
Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas
Correlatas de Intolerância.
Tive a honra de ser
designado pela Câmara dos Deputados para relatar o Projeto de Decreto Legislativo que
aprovava a convenção. Trabalhei intensamente para produzir um relatório
coerente, bem fundamentado, capaz de sensibilizar os meus colegas parlamentares
a votarem pela ratificação da Convenção, o que acabou acontecendo, em primeiro
turno por 414 votos a 39, e em segundo turno por 417 votos a 42, no dia 9 de
dezembro de 2020.
Durante o processo de elaboração
do meu relatório, tinha em mente a importância da Convenção para o
enfrentamento do racismo estrutural brasileiro.
Rememorei as inúmeras
manifestações, em âmbito nacional e local , do racismo entranhado na sociedade
brasileira, que venho combatendo ao lado de muitos(as) militantes da causa da
promoção da dignidade humana e da luta antirracista.
Recordei, em especial,
a diligência que coordenei da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da
Câmara dos Deputados ao estado do Rio de Janeiro, em 2017, ao lado da deputada Benedita da Silva e do deputado Wadih Damous, para visitar no presídio Bangu 2, local onde
está o jovem negro Rafael Braga, único preso das manifestações de junho de
2013, em razão do porte de uma garrafa de Pinho Sol. Rafael foi condenado a 11
anos e três meses de prisão, além do pagamento de R$ 1.687,00.
Diante de
nós, o choro copioso de Rafael Braga revelou a dor insuportável de quem carrega
sobre os ombros o fardo do racismo estrutural que permeia as instituições do
sistema de justiça e segurança no país, que usa a lei
tal como um açoite a castigar os corpos negros.
Lembrei, também, dos
olhos marejados e da voz embargada, clamando por justiça, da D. Maria José da
Silva, mãe de Davi da Silva, adolescente negro de 17 anos que desapareceu após
ter sido abordado por uma equipe do Batalhão da Radio Patrulha da Polícia Militar, no Conjunto Cidade Sorriso I,
em Maceió, em 25 de agosto de 2014.
A minha esperança é que
a convenção que traz em seu bojo uma definição específica e objetiva de
racismo, discriminação e intolerância, propondo a proteção, em qualquer âmbito
da vida pública ou privada, de todos os seres humanos contra odiosas atitudes
de discriminação e de intolerância, incida decisivamente no conjunto de
práticas institucionais, históricas, culturais e interpessoais que alimentam,
reproduzem e mantém intacto o racismo no Brasil.
Paulão é deputado federal (PT/AL) e presidiu a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados entre 2017/2018.
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