Que
resta aos bolsonaristas?
Por
Adriano Nunes *
Os bolsonaristas sustentam-se
emocionalmente e moralmente uns aos outros. Em seus grupos fechados de
whatsapp, compartilham fake news e notícias que apenas ainda os contentam e os
iludem. A realidade não lhes interessa. Ela os fere, pensam. Incapazes de
reconhecer que apoiaram tudo de horror e absurdo que aí está, tudo de grotesco
que se vem desenhando no cenário nacional, incapazes de querer enxergar o estado
autoritário, fundamentalista, preconceituoso, moralizador e sob diversas
suspeitas mesmo graves, recorrem justamente a argumentos que criticaram quando
na era petista. Vou reforçar a memória: durante os escândalos do mensalão e
petrolão ficavam indignados (seletivamente, claro, como a história vem
demonstrando!) com o argumento da cúpula petista de que "não sabia do que
estava acontecendo". Agora, lançam mão do jargão: "votei no pai e não
no filho!" como se a linha entre um e outro fosse tão nítida e intransponível.
Rejeitam as evidências de corrupção como se "corrupção" fosse o menor
dos crimes, como se a corrupção fosse menos danosa do que ser de esquerda. Até
quando vão continuar a fechar os olhos para os ataques às universidades
federais, às artes, às ciências, aos professores, aos negros, aos LGBTQ+, aos
índios, ao meio ambiente, à saúde pública? Até que ponto irão abraçar as
grosserias e perseguições à imprensa feitas pelo Chefe de Estado, porque este
odeia a crítica, o questionamento, a verdade pública? Até quando vão negar
cegamente as verdades fatuais, a história como fundamento para a realidade? Vão
relativizar as milícias e toda a sua estrutura criminosa? As evidências mostram
o quê? Não é preciso, óbvio, condenar ninguém sem julgamentos justos, mas não
dá para evitar pôr a crítica de lado. Numa democracia, liberdade de expressão e
crítica servem para expor os arbitrários atos de quaisquer governos. Deve-se
permitir no mínimo a algum tipo de questionamento: "por que isto?",
"por que fez e faz isso?", "será mesmo"?, etc. Permitir-se
à dúvida ainda que ela venha a dilacerar nossos anseios de realidade e sonhos,
ainda que faça tudo ruir e doer! Será então que vocês, bolsonaristas, vão
continuar a relativizar os péssimos índices econômicos que se desenham já há 1
ano? Continuar a relativizar aumento dos preços de diversos produtos, a alta do
dólar, o preço da carne, da gasolina, do gás? Sempre vão achar desculpas para
iludirem-se porque têm medo e vergonha de reconhecer que foram humanos e
erraram? Vão continuar a acreditar na extrema direita como salvadora da pátria
e da democracia? A extrema direita que sempre agiu de forma autoritária,
racista, misógina, homofóbica, antissemita, na história do mundo? Não bastam as
indicações desmedidas para áreas do Governo que merecem pessoas realmente
capacitadas e sem um viés de intolerância, sem que tentem impor a todos uma
moral moralizadora? Não bastam as nítidas tentativas de nepotismo? Com medo da
desilusão avassaladora, os bolsonaristas agarram-se ao que ainda têm: a fé numa
religião política, na crença de que somente assim a esquerda será destruída.
Que tolice! Todos que assim pensaram no decurso histórico falharam! É uma luta
inútil e desnecessária! Enganados na própria tolice e covardia, buscam-se uns
aos outros envergonhados de si como se tivessem um fio de Ariadne rompido e,
por isso, negam-se a sair do labirinto de horrores. Como alguns permanecem
receosos de admitir a falha fatal que cometeram, com medo das cobranças
externas, preferem, pois seguir rumo ao abismo do nada, arcando com as
consequências funestas, ainda que essas atinjam a todos. O bolsonarismo é uma
falha moral acrítica. Surgiu como uma forma de repúdio à corrupção de parte da
esquerda. Hoje, sustenta-se no mito de que tudo dará certo porque se for
antiesquerda dará certo. Que bobagem! Ao que os fatos reais indicam, nunca dará
certo, sob esta perspectiva! Autoritários, dogmáticos e demagogos nada de
democrático têm a oferecer. Não se constrói uma democracia livre, com respeito
e preservação das liberdades, com pessoas autoritárias e impregnadas de
rancores e ódios. Os liberais que apoiaram tudo isso já devem estar com
vergonha do que fizeram. Uns já conseguem criticar o que aí se apresenta.
Outros, presos à ideologia e à hipocrisia, silenciam. Como abrir bem os olhos
em situações desumanas e cruéis? A história pode dar dicas, pistas, exemplos,
trazer algumas reflexões. Mas o papel do presente é demais importante: ver o
agora, pensar o agora, sabê-lo, compreendê-lo, pode engendrar um meio racional
de não mais ficar a defender o indefensável. Se ainda resta consciência a algum
bolsonarista, deve ser muito doloroso para ele enxergar a si no espelho da
realidade das coisas, dos acontecimentos. Deve ser cruel ter que encarar e
enfrentar o fiasco da escolha que fizeram. Se não havia escolhas, como alegam,
será que era mesmo preciso a escolha do que se apresentava como o menos
democrático, o menos apegado à tolerância e às liberdades? Será que seria mesmo
necessário flertar abertamente com o horror? As evidências, os discursos, as
práticas, as posições defendidas antes já não demonstravam ou indicavam, de
algum modo, tudo que estaria por vir? Ou vocês, bolsonaristas, são o que são e
amam a irracionalidade, tudo que se finca no status quo? Deem uma chance a
vocês mesmos: passem a questionar as próprias escolhas! Não se surpreendam se o
arrependimento os atingir em cheio.
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