Íntegra da entrevista do Presidente LULA
para a revista alemã Der Spiegel
Jens
Glüsing, jornalista da revista, no dia 15 de maio de 2019.
Lula lembra que “o Brasil
estava a caminho de se tornar a quinta maior economia do mundo e agora temos
esse desastre” afirmando que Bolsonaro “incendeia o país inteiro”
Na última vez que eu acompanhei o senhor, foi na fronteira com o
Uruguai. Era um momento em que o senhor estava brincando que era só dar um pulo
e já estaria fora do Brasil. O senhor em algum momento se arrependeu de não ter
saído do Brasil?
Não. Porque eu tinha eu tinha algumas coisas na cabeça que eu não queria
abrir mão. Primeiro, eu já tenho 73 anos de idade, segundo que eu fui
presidente do Brasil, terceiro que eu sou uma figura por demais conhecida e eu
não me via como fugitivo, que era o tratamento que iam me dar. Então, eu tive
muita gente discutindo comigo se não era importante sair do Brasil, se não era
importante ir para uma embaixada, e eu cheguei a conclusão de que eu não ia
sair do Brasil e que se tivesse decisão de prisão que eu viria para cá. Porque
como eu estou numa disputa sobre a verdade, numa disputa para provar que
mentiroso são aqueles que me acusaram, que eu estou muito à vontade aqui. Sabe,
eu acho que quem tá fora tá mais incomodado do que eu. Porque sabe que vai chegar
o dia em que eu vou poder provar, sabe, que eles mentiram e que montaram um processo, subordinado a orientação
americana, hoje está mais do que claro que o Departamento Nacional de Justiça americano
está envolvido nisso, que tá envolvido os interesses das petroleiras do mundo
inteiro no que aconteceu no Brasil, então eu estou tranquilo. Eu não sei se o
Moro tem a mesma tranquilidade que eu, não sei se o Dallagnol tem a mesma
tranquilidade que eu, se os juízes do TRF-4 tem a mesma
tranquilidade que eu. Estou tranquilo, ando de cabeça erguida e não sei se eles
andam
Em algum momento imaginou que um dia estaria preso?
Olha, eu não sei porque, mas alguma coisa me dizia
que desde que começou a Operação Lava Jato, que tinha um endereço certo: o Lula. Eu intimamente
ficava imaginando que não era possível fazer o impeachment da Dilma, e depois permitir
que o Lula seja eleito Presidente da República. Não combina. Não é real, se
eles estão tirando a Dilma pela razão que eu acho que eles estão tirando a
Dilma, porque a Dilma deu continuidade a uma política de grande inclusão social
nesse país – é importante lembrar que mesmo com a crítica a política econômica,
nós chegamos em dezembro de 2014 com 4.5% de desemprego, era o menor
número da história do Brasil. Então eu ficava pensando, bom se eles estão
fazendo o impeachment da Dilma por conta da política de inclusão social que ela
está fazendo, por conta da política de partilha do petróleo, porque trouxemos
o petróleo para nós outra vez. Eles não vão permitir que eu volte à presidência
da República. Isso eu tinha muito claro na cabeça, e resolvi enfrentar.
O senhor foi condenado por supostamente aceitou um apartamento em troca
de supostas vantagens e tem outras acusações contra o senhor. O que deixa o
senhor tão otimista que irá conseguir provar sua inocência?
Eu não tenho que provar a minha inocência. A minha inocência já está
provada. O que eu estou desafiando eles é para provarem a minha culpa. Porque
em algum momento essa gente vai ter que mostrar. Você veja uma coisa, eu fui
julgado na primeira instância, fui condenado sem que houvesse uma única prova.
É importante lembrar que o procurador quando fez a denúncia, ele apresentou um PowerPoint
e ele disse que ele não tinha prova, ele só tinha convicção, tá? O juiz, ao
fazer o julgamento, ele também não tinha prova, ele disse “não acusei o
presidente de ter negócio com a Petrobras”, e me julgou por fato indeterminado. Aí eu fui para o
TRF-4, eles nem leram o processo e me julgaram, por que? Porque era preciso me
condenar para tentar me colocar de forma proibitiva no processo eleitoral, tá?
Agora, quando eu fui no STJ, outra vez as pessoas não leram a os autos do processo, ou seja, não
leram a defesa. Então eu estou ficando um pouco… sabe, o processo já tem aqui
um trilhão de páginas, e as pessoas não leem o objeto central que é a prova.
Alguém tem que provar que o apartamento é meu, alguém tem que provar que tem
dinheiro da OAS, alguém tem que provar que tem dinheiro da Petrobras. Alguém tem que
provar alguma coisa! Que não é possível que alguém esteja preso na espera de
que alguém prove que ele é culpado e ninguém prova. É por isso que eu digo
sempre, Jens, que o meu papel nesse momento é brigar para restabelecer a
verdade nesse país. Pode demorar, não tem problema, vai ser duro, vai ser duro,
eu preferia estar em liberdade, mas tem uma coisa que eu não quero abrir mão,
que é uma coisa chamada dignidade. Eu digo sempre, dignidade
e caráter você não compra em shopping, você não compra em supermercado. Você
nasce com ele.
Então isso eu não vou abrir mão e eu quero provar que quem não tem
caráter é quem me condenou.
O senhor se considera um preso político?
Me considero e depois de tudo que tá acontecendo… Eu não falo muito
nisso porque acho que não é bom ficar falando de mim quando o povo tá sofrendo
muito mais do que eu. Porque a verdade é que eu estou preso, mas o povo em
liberdade…os pobres voltaram a passar fome, estão desempregados. Tem gente
passando muita miséria nesse país, tem gente que tá perdendo o direito de
sonhar. A juventude, que no meu governo sonhava em ir para a universidade, está
agora tendo pesadelo com essa política de corte do governo. Então, eu
sinceramente me considero um preso político. O fato de eu ter sido condenado, o
fato do Moro ter aceito ser ministro do Bolsonaro. O fato do Bolsonaro dizer
para ele esses dias que tinha acertado com ele antes. É mais do que prova que
foi um jogo. Não é que o Bolsonaro garantiu para ele que daqui a dois anos tá
certo que ele vai ser, mas ele fez mais do que isso, ele garantiu que o
Bolsonaro fosse eleito presidente da República impedindo a minha possibilidade
de ser candidato.
O Brasil passou nesses últimos anos por uma montanha russa. No seu
governo a economia andou bem. O senhor foi
considerado ”o cara”, a famosa frase do Obama, depois entrou em uma crise e o
impeachment da Dilma. O que aconteceu com esse país?
Eu penso que você entenderá o que aconteceu no Brasil, se entender o teu
comportamento como ser humano. Ou seja, você só respeita pessoas que te
respeitam. Então, a pessoa para merecer o teu respeito você tem que ter
credibilidade junto à pessoa e a pessoa junto você, e tem que ter
previsibilidade de comportamento. Na economia não existe mágica. A fórmula
adotada pelo FMI não deu certo em lugar nenhum do mundo. Toda a política de
ajuste proposta pelo FMI sempre vem no interesse de favorecer os banqueiros que
tem os títulos dos países que são devedores. Não sei se você se lembra que na
crise de 2008, quando a crise foi na Europa e a crise foi nos Estados Unidos, o FMI não deu palpite. O FMI não falou. E por que o Brasil aproveitou
a oportunidade entre 2003 e 2014? Porque a gente tinha, primeiro a
credibilidade é uma coisa que eu gosto. Eu
gosto de respeitar para poder ser respeitado. E quem não respeita
nunca será respeitado. Segundo eu quero ter previsibilidade para ninguém ser
pego de surpresa à noite, não tem política feita à meia-noite, a gente tem que
dizer claro o que nós vamos fazer e todo mundo saber, do mais humilde ao maior.
E foi assim que eu governei. O mundo inteiro sabia, por isso que eu digo, a
solidariedade da Ângela Merkel, tive solidariedade de solidariedade do
Schoereder, do Bush, depois do Obama, do Chirac, do Sarkozy, sabe do Tony Blair
e do Gordon Brown, do ministro Singh da Índia, do Hu Jintao, eu tive
solidariedade de todos os países porque as pessoas falavam que nós estávamos
fazendo as coisas corretas. Então nós cuidamos da política ambiental, de reforma agrária, de inclusão social, da política de geração de
empregos. O Brasil chegou a Copenhague em 2009 próximo de ser a quinta economia
do mundo. Eu até brincava com os alemães, se
preparem que nós vamos passar a Alemanha logo logo. E agora virou
esse desastre, porque ninguém confia em ninguém, eu dizia agora a pouco para um
amigo seu da imprensa que o Bolsonaro tá mais para Nero do que para presidente
do Brasil, parece que ele tá colocando fogo no país, ou seja não existe no dicionário
deles a palavra emprego, não existe a palavra crescimento, não existe a palavra investimento,
desenvolvimento, não existe a palavra construir, educação, ou seja tudo
neles é para destruir tudo, como se fossem uma praga de gafanhoto. E o povo não
pode permitir. O povo não pode permitir um presidente da república que bate
continência para a bandeira americana. Um
presidente da República que viajou aos EUA e não tinha nenhuma autoridade que
queria recebê-lo, veja que coisa medíocre, como não tinha nenhuma autoridade
oficial que quisesse recebê-lo, ele ter implorado para que
o Bush o recebesse no Texas. A importância do Bush nos Estados Unidos, com todo o respeito
que eu tenho, é zero. É nada. E o presidente do Brasil vai ao Texas, e tem como
principal autoridade, uma visita que ele deve ter implorado ao presidente Bush.
Então lamentavelmente eu acho que o Brasil não merecia o que tá passando, o
povo não merece isso. Esse povo aprendeu a comer, esse povo aprendeu a ganhar
aumento de salário. Todo o ano o salário mínimo aumentava. Esse povo aprendeu a entrar na universidade, a ter escolas
técnicas. E o povo está vendo isso escapar pelas mãos em benefício de quem?
Quem que representa esse Ministro da Economia? Ele serve a quem? Não pode ser o
Brasil nem pode ser o povo. Esse cidadão depois de vender tudo que pode vender
ele vai embora morar em Nova York e o Brasil fica com a desgraceira que eles
estão criando, não é possível. Por isso que eu acho que o povo precisa reagir
enquanto é tempo. Porque toda vez que a sociedade se comporta negando a
política acontece isso. Toda a vez.
O PT não tem uma certa responsabilidade com essa virada política do
Brasil, porque negligenciou a questão da corrupção? O PT apareceu
combatendo a corrupção, uma nova ética e depois aconteceu o que aconteceu
Vamos ver se na história do Brasil tem um partido que mais criou
instrumento de combater a corrupção do que o PT. Você pode, sabe, como já tá
muito tempo no Rio de Janeiro, fazer uma
pesquisa para saber quantos presidentes da República desde Getúlio Vargas até
agora fizeram o que o PT fez para combater a corrupção. Não apenas nas mudanças
de ordens jurídicas, sabe transformando em leis, mas também de transparência,
como o PT se comportou. Lógico que na hora que você cria mecanismo de
investigação, na hora que você aparelha a Polícia Federal com inteligência, com
mais gente, na hora que você dá mais liberdade ao Ministério Público, na hora que você cria condições objetivas, se
houver corrupção ela começa a aparecer. E se acontecer corrupção, pode ser quem
quer que seja, tem que pagar o preço. O PT não se exime disso, tá? Eu quero
falar de mim. Eu duvido estar em processo de corrupção. Duvido. Ah eu tenho
pedido o seguinte, qual é a diferença da arrecadação do PT para outros partidos
políticos? Qual é arrecadação? Vamos ver como é que arrecada o PSDB e o PP, todos
os partidos políticos. Nós vamos perceber que
todo mundo, sabe, recolhe dentro do mesmo jeito, mas só tá preso o Vaccari. Os
tesoureiros dos outros que arrecadaram do mesmo jeito não estão. Nós cometemos
erros, cometemos, e nós pagamos por eles. A minha indignação é porque eu não
cometi erro. E se cometesse devia pagar. Agora o PT, embora tenha cometido erro
é importante saber que o PT não está sendo condenado pelos erros que cometeu. O
PT sabe, está sendo demonizado pelos meios de comunicação. Você sabe disso.
Desde 2005, e foi se criando um ódio, ódio, ódio. Você sabe quantas horas eu
tenho contra mim no Jornal Nacional? Você sabe quantas capas de revista Veja
contra mim, de Época, de Isto É? Você sabe quantas primeiras páginas de jornais
eu tenho contra mim? Milhares e milhares e milhares e ainda assim, se eu fosse candidato a presidente eu
teria sido eleito porque o povo me conhece. O povo sabe que eu estou sendo
vítima de uma perseguição política. O povo sabe que a elite brasileira não
aceita inclusão social, não aceita. O pobre não pode andar na mesma calçada, o
pobre não pode frequentar o mesmo restaurante, o pobre não pode ir no mesmo
teatro, o pobre não pode ir no mesmo Shopping, o pobre não pode estar no mesmo
aeroporto, o pobre não pode estar na mesma universidade. Ora, que história que
é essa? O país é de todos, todos podem tudo. Então eu cometi um crime, eu
cometi um grande crime, dizer para uma criança pobre “você vai disputar uma vaga na universidade com o
filho do patrão do seu pai”. E se você estudar você vai ser melhor do que ele e
você vai passar. Eu consegui fazer
com que as Universidades trocassem um pouco dos seus impostos
por vaga para 2 milhões de jovens da periferia fazerem universidade. Esse foi o
crime que eu cometi. Eu fiz a Petrobras ser a segunda empresa do mundo na área
de energia. Eu fiz a maior capitalização da história do planeta em se tratando de
capitalismo, a maior capitalização não foi feita em Nova York, não foi feita em
Tóquio, não foi feita em Frankfurt, foi feita na Bolsa de Valores em São Paulo,
quando nós fizemos a Petrobras sabe, quando o governo investiu nas ações da
Petrobras vendendo 5 bilhões de barris de petróleo do pré-sal a troco de ações. Ora, eu cometi um crime quando recuperei a indústria naval
brasileira, que tinha 2.000 trabalhadores e passou a ter 82.000 trabalhadores,
porque a elite brasileira queria que a gente importasse de Cingapura,
importasse navio da China. Ora, então o meu crime foi ser brasileiro. O meu
crime foi defender a soberania Nacional. O meu crime foi acreditar nos vizinhos
parceiros do Brasil e criar o fortalecimento do Mercosul e da Unasul e criar
o BRICS. O que jogaram contra o PT não foi por conta dos erros, mas por conta
dos acertos. Isso nós podemos ficar tranquilos.
Nada de ficar nervoso, nada de perder a estribeira, né, de ficar dando
cabeçada na parede. Política é assim mesmo, um dia a gente ganha, um dia a
gente perde, sabe. Eu lembro que uma vez eu conversei com uma companheira na
Alemanha, ela falou “oh Lula, como é que a gente vai derrotar a Angela Merkel,
porque sabe, ela é tratada pelo povo como se fosse uma mãe, então como pode até
ter divergência ideológica, mas ela se comporta como uma mãe e ninguém quer
brigar com a mãe “. Então o PT foi um pouco isso, o PT foi generoso com quem
precisa do estado brasileiro e não deixou de ser generoso com os ricos. Então,
sabe, eu tô carregando a minha cruz aqui, tá. Agora, pode ficar certo que os
pecados foram outros que cometeram, e eu quero provar isso.
Agora, a justiça diz que houve um esquema gigante de corrupção dentro da
Petrobras para financiar os partidos, tudo isso é…
Mentira. Mentira. Pode ter havido um ou outro caso, a Petrobras é uma
empresa muito grande, que passou a movimentar 30 bilhões por ano de
investimento. Nós passamos a comprar sonda e a fazer sonda com os estaleiros
brasileiros. Então hoje eu não tenho dúvida, e a imprensa estrangeira pode até
ajudar, eu depois que li um livro, esqueci até o nome do autor do livro, sobre
o petróleo, que conta a história do petróleo desde 1859 quando ele surgiu nos
Estados Unidos, eu me convenci que o que aconteceu no Brasil tem a ver com os
interesses das petroleiras americanas. Não era possível aceitar que o Brasil
tivesse feito a maior descoberta de petróleo do Século 21. Ainda não sabemos se
tem 100 bilhões de Barris ou 150 bilhões, 200, o que nós sabemos é que temos
uma grande reserva e americanos não podem permitir que isso continue sendo
explorado pelo Brasil. A elite brasileira, junto com a elite das petroleiras do
mundo não admitem a lei da partilha que nós fizemos, dizendo que o petróleo é
do povo brasileiro, e 75% do royalties será destinado à educação, para que o
Brasil recupere no século 21 o atraso do século 20, será investido em ciência e
tecnologia, será investido em saúde. É por isso que era preciso derrubar a Dilma, é por isso que era
preciso fazer o impeachment. E era por isso que criaram todas as condições
ilegais para evitar que o Lula fosse candidato a presidente, porque eles sabiam
que mesmo preso eu seria eleito o Presidente da República.
Agora, o senhor durante o seu governo, parecia muito bem aceito pela
elite brasileira. É uma ilusão, o senhor se iludiu?
Não era ilusão não. Eu tinha uma coisa que não sei se você alguma vez
ouviu falar, eu dizia o seguinte: eu primeiro
sou o presidente de todos, eu governo para o rico e o pobre, agora todo mundo
tem que saber que eu tenho uma preferência para aqueles que mais necessitam. Ou seja, dar um
sapato para quem não tem sapato, dar um prato de comida para quem não tem
comida, dá uma roupa para quem não tem roupa, dar escola para quem não tem
escola, todo mundo sabia disso. Sem me importar que os ricos continuassem
ganhando. Foi assim que eu resolvi governar o Brasil porque eu queria ter uma
política de inclusão muito forte. É por isso que nós fizemos a maior política
de inclusão social da história desse país. E eu fazia questão de tratar todo
mundo bem. Eu cheguei quase que a ser unanimidade. Eu deixei o governo em
dezembro de 2010 com 87% de bom e ótimo, 10% de regular e 3% de ruim e péssimo,
foi assim que eu deixei. A campanha de 2010, que foi a campanha que elegeu a
Dilma, não teve um único panfleto nesse país falando mal do Lula. Um único
panfleto de nenhum adversário falando mal de mim.
Como se explica essa raiva, esse ódio que tem ao senhor?
Meu caro, quando você casa você vai em frente do padre se você é
católico e promete que vai amar para o resto da vida, na doença, na saúde e
dois anos depois você está separado. Ou seja, eu acho que, em 2013, primeiro
vamos trabalhar o seguinte, você sabe que no meu governo, embora eu tive toda
essa aprovação, eu nunca tive benefício da imprensa. Você é testemunha disso. A
imprensa sempre me tratou mal. Não há matéria favorável a mim na imprensa
brasileira. Eu resolvi enfrentar. Uma vez o Mário Soares, ex-presidente de
Portugal, veio me visitar e chegou com um monte de jornal debaixo do braço,
acho que estava a revista Der Spiegel, tava o Le Monde, tava o jornal de
Portugal, jornal da Itália, e ele sentou na minha frente e falou “presidente
Lula eu não tô entendendo nada”. Eu falei, “o que presidente?”. “Eu estou lendo a imprensa estrangeira e você é
Deus, quando eu pego a imprensa brasileira você é o demônio”. Era assim mesmo.
Era uma imprensa de pensamento único contra o Lula, como foi uma imprensa de
pensamento único favorável ao Fernando Henrique Cardoso. Então essa
imprensa, ela foi criando um antagonismo, um antagonismo, e tudo canalizou mais
forte depois das passeatas de 2013 e das eleições quando o Aécio fez uma
eleição propondo o ódio. Quando o Aécio fez uma eleição nervosa, fez uma
eleição… eu nunca vi alguém ofender tanto uma mulher como ele ofendeu a Dilma.
E depois não aceitou o resultado, queria que a Dilma fosse punida. Então o ódio
aumentou. E aí passou a ser o PT o inimigo de tudo né, aí toda direita dizia: o
PT é o inimigo, o PT é o inimigo, para ser dito todo santo dia, de tarde, de
noite, no rádio, o PT é o inimigo então é preciso destruir o PT! Foi assim que
eles falaram e não consegue destruir, eles apenas ganharam uma eleição. Não
consegue destruir o PT porque o PT é o mais importante partido de esquerda
da América Latina. Para eles poderem ganhar do PT tiveram que me colocar na cadeia e
mesmo na cadeia tiveram que rasgar a Constituição, e não permitir que eu fosse candidato mesmo sob judice. Você acha que
eu fiquei nervoso? Não, eles estão nervosos. O ministro Barroso sabe que o voto
dele foi indecoroso. Os que me condenaram sabem o que estão fazendo. Eu tô
nervoso? Não. Eles vão ficar nervosos porque a história vai provar, e a
história não é feita hoje, a história não se conta hoje, se conta algum dia.
Veja Jens, que eu fui muito tranquilo quando eu ganhei as eleições, eu não
fazia grandes promessas, eu não pedi para ninguém sabe, em cem dias eu vou
fazer, porque em 100 dias você não aprendeu nem a sentar a bunda na cadeira. O
cara que promete em 100 dias mostrar o que fez eu não vou dizer o que é porque
eu sou educado, mas não sabe nada. Sabe, se em 100 dias você tiver montado o
teu governo já tá bom, se você já tiver definido as prioridades, já tá bom,
sabe, porque você não consegue fazer nada. Então eu já tinha, por isso que de
vez em quando eu agradeço já ter perdido em 89 para poder me preparar melhor
para ser presidente. Então ganhou as eleições um cidadão que não está
preparado. Porque ele ganhou? Porque a sociedade, eu vou repetir um texto que eu
já li para outro jornalista aqui, mas é um texto que eu achei muito
interessante do Mia Couto, que é um escritor de Moçambique e que no livro dele
tem um texto que eu achei uma frase que eu achei extraordinária “Em tempo de terror, escolhemos monstros para nos
proteger.”
É isso. A sociedade, horrorizada contra a política, apareceu um cidadão
que tinha 27 anos de mandato, nunca fez nada e conseguiu passar a ideia que era
novo e se elegeu. Ou seja, não se elegeu porque alguém votou nele, porque
achava melhor, se elegeu para negar o PT. E quando a escolha é feita não pelo
melhor, mas pelo que se pode, acontece isso. Já tivemos o exemplo do Jânio
Quadros que não deu certo, já teve o exemplo do Collor que não deu certo, e
agora tem o Bolsonaro. É nítido que ele não sabe o que está fazendo.
Eu acho que ele não gosta de democracia, nem ele nem as pessoas ao redor
dele. Eles só conhece uma coisa: arma, armas, armas.
Cada fotografia que aparece junto com ele é só o pessoal fazendo assim (faz
sinal de arma com a mão). Como se arma fosse solução. Arma pode ser solução
em tempo de guerra. Mas em tempo de paz o que resolve é livro, é carteira de
trabalho, é salário, é sala de aula, é isso que a gente tem que perceber. Não sei se você percebeu, que você já tá aqui desde
janeiro, você já tá no Brasil há muito tempo, mas você não ouviu ainda a palavra
investimento. A palavra desenvolvimento. A palavra geração de empregos. A palavra inclusão social. A palavra investimento em educação.
Você não ouviu nada. Começou com a destruição dos Mais Médicos e aí começa a
destruir tudo que nós fizemos para garantir uma boa política ambiental no país,
todos os direitos trabalhistas. Agora só fala na reforma da Previdência como solução
de tudo. A reforma da Previdência pode resolver
o problema dos bancos, mas não resolverá o problema do povo. Então só tem um
jeito, é o povo reagir contra isso. O povo não elegeu Bolsonaro para ele
destruir o Brasil. Ninguém é eleito para destruir o Brasil. Eu digo sempre, nem
Nero virou Imperador de Roma prometendo que ia queimar Roma. Então esse cidadão
é um perigo para o Brasil. É um perigo ele não levar em conta a questão da
soberania nacional. E o que é mais grave são os militares que estão com ele,
que me parece esqueceram de qualquer princípio de nacionalismo, sabe, defender
a nossa fronteira, defender o nosso povo, defender nossa tecnologia, defender a
nossa diversidade, a nossa Amazônia, nossa água, o nosso território, a nossa indústria, nossos bancos, a
nossa Petrobras. É para isso que a gente quer Forças Armadas altamente preparadas do ponto de vista científico e tecnológico,
bem preparada, do ponto de vista de armamento, para defender nossa soberania.
Senão, serve para nada.
Você teve uma boa relação com os militares, com as forças armadas. O que
aconteceu agora?
Eu gostaria de saber. Um dia quando sair daqui, espero poder ter uma
conversa com algumas pessoas nas Forças Armadas que eu quero compreender.
Porque olha, eu tô falando olhando na cara de um jornalista alemão, e olha,
eles tiveram 23 anos de regime militar e eu tô olhando na sua cara para dizer
que duvido que em algum momento da história
das Forças Armadas eles foram tratados com dignidade que eu os tratei. Que eles
receberam o dinheiro necessário para o seu funcionamento que receberam no meu
governo. Duvido. Agora, por que que de repente um general Comandante das Forças
Armadas vai na Suprema Corte dizer que eu não posso ser candidato eu não sei.
Somente quando sair daqui, eu vou poder perguntar. Porque olha, se um General
não é capaz de ser nacionalista, se um general não é capaz sabe, de respeitar
suas fronteiras, realmente ele não deve nem ser General. O princípio básico é
que as Forças Armadas existem para defender a nação contra possíveis inimigos
externos, para defender a nossa Fronteira, para defender o nosso povo, para defender
o nosso conhecimento. Senão, para que serve? Como é que pode as Forças Armadas
Brasileiras aceitar um cargo de segundo comandante da chamada quarta frota
americana. Por que que foi recuperada a quarta frota? Porque nós descobrimos o
pré-sal. E onde fica o pré-sal? Fica a 200 milhas da costa brasileira, portanto
está na divisa do território do mar internacional. Porque os americanos, em
tempos de paz, resolveram recriar a quarta frota que funcionou na Segunda
Guerra Mundial. Quer saber minha opinião? Por conta do pré-sal e por conta,
agora, do petróleo da Venezuela.
Eu não quero que isso aconteça. Sinceramente acho que o povo brasileiro
não merece o que tá passando, desse Bolsonaro que faça o esforço que tiver que
fazer, que tome juízo, e que governe esse país pensando no povo brasileiro,
pensando nas mulheres, nos homens, nos trabalhadores. Que essa pessoa passe a se respeitar
sendo presidente desse país. Que queira ser presidente, que aprenda a ser
presidente, que aprenda a ser civilizado pelo menos. Então, eu sou contra golpe
militar. Obviamente que se acontecer alguma coisa e o Bolsonaro tiver que sair
é o vice que tem que assumir. Também não acho que por isso a gente deva ter
mais medo, sabe, mais medo do que já temos. Acho que a democracia brasileira
corre perigo. Até porque temos pouca democracia. Ele
está destruindo tudo.
Veja uma coisa fantástica que nós construímos nos nossos governos, os conselhos.
Conselho indígena, conselho de negros, conselho de portadores de deficiência
física, ele está destruindo tudo. Destruindo
universidade, parando investimento em Ciência e Tecnologia, é uma barbárie de
uma ignorância. Eu nem sei se é má fé, mas é pura ignorância. Esse cidadão
precisa uma hora parar, sentar e conversar com a sua consciência. Não basta
falar, não nasci para isso. Se não nasceu, deixe para quem nasceu para isso
fazer o que tem para fazer. Então até agora o governo Bolsonaro é muito mais
uma piada. Quanto tempo você acha que levou para construir um castelo daqueles
bonito que tem na Alemanha? 200 anos, 300 anos às vezes é isso? Para destruir é
dois minutos. No Brasil, para você construir uma política de inclusão social
leva décadas. Décadas. Esse país tem uma dívida com o povo brasileiro com a
educação que é secular. Esse país tem uma dívida com a questão da reforma
agrária, que é secular. Só para você ter ideia, só para você ter ideia, no meu
governo, nós entre o meu e da Dilma, disponibilizamos para a reforma agrária
52% de toda terra disponibilizada em 500 anos. Ora, por que fizemos isso?
Porque não é possível você não trabalhar uma política de ascensão dos mais
pobres. Quando todo mundo virar com o poder aquisitivo da classe média baixa,
as pessoas tiverem trabalhando, recebendo, pagando seu imposto, consumindo
aquilo que quer consumir, o país vai virar uma maravilha. Vai virar uma
maravilha. E é isso que as pessoas querem, as pessoas não querem discurso, as
pessoas querem comida. As pessoas querem cultura, as pessoas querem
ir lá ver as pessoas, querem liberdade, as pessoas querem estudar, é isso que
as pessoas querem e isso que elas precisam.
A sociedade brasileira está muito dividida, polarizada. De onde vem
isso, vem das redes sociais, vem de 2013, de
onde o senhor achar que vem isso?
Acho que vem de tudo um pouco. O mundo tá assim. Na Alemanha tem um
pouco disso, nos Estados Unidos tem muito, eu estava vendo um livro esses dias
em que há 15 anos atrás, há 20 anos atrás, um Republicano não tinha nenhuma
preocupação que a sua filha casasse com um Democrata, hoje 64% é contra. A
coisa mais normal no processo democrático é sentar alguém da CDU com alguém do
SPD almoçar, conversar e depois cada um vai para sua casa e vai votar no seu
candidato. Assim é no futebol, assim é na cultura, assim deve ser na política.
Agora eles estigmatizaram o ódio. O ódio. E aí quem planta ódio…ganha o que
ganhou. Aquele negócio, né, quem planta vento colhe tempestade. E o Brasil
chegou nessa situação. Sabe, foi assim com a eleição de Jânio Quadros. Jânio ia
acabar com a corrupção no Brasil. O símbolo era uma vassourinha. Ficou 6 meses.
Era assim com Collor. Demorou dois anos e é assim.
A crise está em outros países latino americanos. Não é só no Brasil, mas
também em outros países, em especial na Venezuela. A Gleisi Hoffmann foi
na posse do presidente Maduro. Alemanha e muitos outros países reconheceram
Guaidó, como presidente do parlamento.
Primeiro deixa eu te falar, foi um erro da Alemanha reconhecer. A
Alemanha não era obrigada a obedecer os americanos. Ninguém pode se
autoproclamar presidente. Imagina se a moda pega e daqui a pouco você volta
para Alemanha e se autoproclama primeiro-ministro contra a Angela Merkel.
Está de acordo a Constituição deles.
Não tem Constituição, porque não contestaram a eleição do Maduro quando
ele foi eleito ano passado? Não foi contestada e teve inclusive observador
internacional. Se era para contestar quando manipulou porque não contestaram
tanto Bolsonaro? Não é porque eu concorde com tudo que acontece na Venezuela.
Primeiro, eu acho que a Venezuela é um problema do povo da Venezuela. Ponto. Eu
sou defensor da autodeterminação dos povos. Quem pode tirar um presidente é
quem o elegeu. Ou quem pode tirar é uma votação, ou um processo outro qualquer
legal cumprindo a constituição. Mas um cidadão ir para a rua e se
autoproclamar, e um país sério como Alemanha reconhecer, sinceramente não dá.
Que o Trump reconheça tudo bem, mas a França? Imagina se a moda pega, daqui a
pouco os coletes amarelos na França, vai um cidadão no palanque e, “eu sou o
presidente da França”. Aí vai na Alemanha, aí vai Itália. Acabou com as
eleições? Acabou com as instituições? Então deixa eu lhe falar uma coisa para você.
É muito difícil para você dar palpite sobre um país, a economia de um país. Eu
acho que o Maduro precisaria apresentar um programa que pudesse dar ao povo uma
certa confiança de que alguma coisa vai começar a mudar. Quando eu vejo a
Alemanha falar, a França, a Itália, os Estados Unidos, que precisa ter eleições
na Venezuela: não adianta ter eleições no clima que está. Quem ganhar não leva.
Quem levar não governa. Primeiro é preciso estabelecer um acordo. É preciso ter
um termo de ajuste de conduta. Como nós fizemos com o Chávez em 2002. Tá
lembrado? Nós fizemos um grupo de amigos da Venezuela, participou Brasil,
Argentina, acho que Canadá, Estados Unidos e Espanha e nós conseguimos criar um
clima que restabeleceu a confiança nas eleições na Venezuela. Fazer eleições
agora vai terminar e o clima tá o mesmo. É preciso repactuar o processo
democrático na Venezuela.
Você tinha uma boa relação com o Hugo Chávez. Como você vê ele hoje?
Muitos dizem que a responsabilidade da crise na Venezuela começou com ele.
Os mesmos que dizem
isso vão dizer que a crise da humanidade começou com Jesus Cristo. Você tem que
medir o seguinte. O Chávez foi uma pessoa extraordinária. Eu sinceramente
convivi muito com o Chávez, uma pessoa extraordinária. Ele tinha os defeitos
dele. Mas quem deveria julgar era o povo da Venezuela. Eu achava o Chávez muito
voluntarista, mas ele realmente fez muita coisa na Venezuela. Muita coisa. Os
defeitos dele quem deveria corrigir é o povo da Venezuela. O Maduro ele não tem
a mesma dimensão histórica do Chávez. O Chávez, a eloquência, a oratória, a
simpatia do Chávez, ele tem outro estilo. Agora ali na Venezuela, quem quiser
governar tem que pactuar. É preciso ter gente disposta a sentar na mesa e esse
tal de Guaidó não tá a fim de sentar na mesa. Ele é um pavão. Sabe o que é
pavão? Ele é um pavão sem o rabo. Ele não tem aquele rabo bonito assim aberto.
Você olha na cara dele e vai perceber que ele não merece nenhuma credibilidade.
Se você tiver acesso manda uma cartinha para a Angela Merkel: você errou ao
apoiar o Gauidó. Não é possível. As pessoas poderiam utilizar um cargo para
fazer gestão para encontrar uma saída. Mas radicalizar para radicalizar… Sabe
quem paga o preço? É o povo. É preciso que a gente
tenha uma política de restabelecer a democracia como a melhor coisa na
governança da humanidade, não tem outra coisa melhor. Então não adianta o
Maduro ficar do jeito que tá, e não adianta tirar o Maduro e colocar alguém
para ficar do jeito que está. É preciso construir alguma coisa. Quem senta na
mesa para conversar? Ninguém quer conversar. Eu lembro que quando nós fizemos o
grupo de amigos da Venezuela o Chávez era contra porque ele tinha falado com o
Fidel Castro e era contra o grupo de amigos porque ele achava que os Estados
Unidos ia destruir a Venezuela. E eu dizia não, e o porquê que nós colocamos os
Estados Unidos, é porque a oposição da Venezuela acredita nos Estados Unidos.
Então no grupo não era de amigo do Chávez, era de amigos da Venezuela. Nós
colocamos os americanos e o Aznar( então primeiro-ministro da Espanha). Então é
preciso juntar algumas pessoas do lado da oposição, algumas pessoas do lado do
Maduro, pessoas que sentem com propósito de encontrar uma solução. Se você não
quer solução nem entra na mesa de negociação. Só entra quem quiser encontrar
uma solução e deixar as pessoas discutirem. A mesma tese eu tenho para o
Oriente Médio. Enquanto os americanos forem os tutores do acordo de paz do
Oriente Médio não haverá paz, porque ele é o causador dos conflitos. Interessa
a ele.
Em alguns países latino-americanos a esquerda está ressurgindo. O México
elegeu um governo de esquerda, na Argentina parece que a Cristina Kirchner tem chances de ganhar as
eleições se for candidata. O senhor pensa em ser candidato novamente?
Olha eu tô pensando em ficar vivo. Eu não sei se vou tá vivo até daqui 4
anos. Eu acho que nós temos que produzir novos candidatos, tem gente boa dentro
do PT, fora do PT, não penso em candidatura. Eu sinceramente estou pensando
nesse instante é na minha vida, em resolver meus processos, em provar que o
Moro é mentiroso, que o Dallangol é mentiroso, que eu sou vítima de um processo
político, esse é meu desejo. E por isso que você está vendo aqui a cara de um
ser humano tranquilo.
Você sempre foi uma pessoa muito comunicativa. O senhor sofre na cadeia
quando está sozinho, como o senhor lida com isso?
Sabe, quando eu estava no sindicato, sabe eu vou contar uma novidade que
eu nunca contei. E era uma pessoa muito inibida, tinha muita vergonha, então eu
às vezes eu estava em um evento se falasse meu nome eu já ficava nervoso. Eu
comecei a me preparar, eu colocava fotografia com muita gente na minha frente,
eu ficava fazendo discurso para um público imaginário ali na foto. Eu vou
trazer umas fotos aqui na cadeia para colocar na parede da minha cela, quando
eu tiver querendo fazer desculpa eu faço um discurso para o povo. Eu não guardo solidão. Eu convivo bem com
isso.
O senhor recebe esses cumprimentos do pessoal lá fora.
Todo o dia. Todo o dia tem um bom dia, toda tarde tem uma boa tarde, e
toda noite tem uma boa noite. Todo o dia. Quando eu sair daqui eu serei
eternamente agradecido a esse pessoal. Eu
só espero o dia que eu sair daqui, para sair daqui pela porta da frente, ir lá
tomar uma bela de uma cachaça com eles e comemorar até outro processo que a
gente nunca sabe quando é que vai terminar. Mas eu tento trabalhar assim. Eu
tento conviver com a realidade. Eu tenho uma preocupação muito, mas muito
grande com a situação do povo. Porque a gente conseguiu provar com o nosso
governo que era possível ele melhorar de vida e que era possível tomar café de
manhã, almoçar, jantar, que era possível trabalhar, que é possível ter aumento
de salário, a gente provou isso, a gente provou que era possível. Pobre no
mundo inteiro não é problema, o pobre é solução. Eu quando deixei
à presidência eu fui visitar vários países africanos, eu discutia com o
presidente, olha se você começa a discutir o orçamento de uma nação pelos
militares, pelos diplomatas, sabe, pelos quem tem diploma universitário não vai
sobrar dinheiro para os pobres. Então começa a discutir o orçamento pelos
pobres, o que vai ser deles, qual é a parte deles. Aí o que sobrar você então
vai dividir para os outros, porque os outros não vão ter problema de passar um
dia sem comer, os outros não tem problemas sabe, se não tiver o dinheiro
amanhã, mas o pobre não pode
esperar, a fome não dá trégua. Você não tem noção o que é uma
pessoa com fome conversando com você. Aparentemente você pensa que a pessoa tá
bem, mas lá dentro uma lombriga tá comendo a outra. A pessoa tá com dor e as
pessoas não percebem. Então quem quiser governar tem que levar em conta isso,
só vai acabar com a miséria no mundo quando a gente colocar o pobre como
prioridade. Não é que eu tô tirando de você. Eu não quero tirar nada de você,
eu quero apenas que aquele lá de baixo possa ser igual a você, para isso ele
tem que ter oportunidade de estudar.
Como a situação do senhor afeta sua família? Eu li que a filha do senhor
esteve vendendo ovos de páscoa.
É muito difícil, mas não tem que reclamar. Não tem o que reclamar porque
quando eu vivia em Pernambuco eu vivia pior que todo mundo. Eles estão comendo,
tomando café, almoçando, jantando. Não tem o que reclamar. Eu sinto porque eu
gostaria que eles não estivessem em situação difícil. Mas também não vou ficar
lamentando. Eu várias vezes de domingo vi minha mãe, na beira de um fogão sem
ter nada, absolutamente nada para colocar no fogo e a minha mãe não reclamava.
E eu não nasci um homem nervoso, um homem irritado, não, vamos trabalhar que
amanhã a gente conserta. É por isso que eu trato assim, eu trato isso com essa
frieza. Deus é justo por isso, ele escreve certo por linhas tortas. Hoje eu tô
aqui preso, o Moro é ministro da Justiça, o Dallagnol queria já levar dois
bilhões e meio da Petrobras para criar uma Fundação, tem mais seis bilhões
da Odebrecht, que não sei mais quem vai levar, tem mais dinheiro da Camargo Corrêa,
eu sei que tem dinheiro para tudo quanto é lugar que a fundação deles ia pegar.
Não sei para quê, não sei se é para criar um partido político. Eles acham que
estão tudo bem e que eu tô aqui na pior. Vamos deixar o tempo passar, vamos
deixar o tempo passar. O tempo vai se encarregar de mostrar quem é quem.
Joaquim Silvério dos Reis não é lembrado na história do Brasil. Tiradentes é. E
Tiradentes foi transformado em herói mais de 100 anos depois, por aqueles que
foram responsáveis pelo seu enforcamento e pelo seu esquartejamento. Então, a
história não retrata os heróis naquele momento, nem sempre o herói está na
foto, as vezes o herói não está na foto. Então por isso a minha tranquilidade.
Não esteja em Copacabana tomando uma caipiroska domingo a tarde achando que eu
estou pior que você, eu estou bem.
Na questão da corrupção, qual era o papel da Odebrecht no seu governo?
Porque parece que a Odebrecht está em todos os países da América Latina agora
com escândalos. Você se arrependeu da sua relação com a Odebrecht?
Não. Não me arrependo minha relação com nenhuma empresa, com nenhum
banco, com nenhum empresário, nenhum trabalhador. Não me arrependo, tá. Tenho
consciência da importância da Odebrecht para o Brasil no mundo. E quero lhe
dizer o seguinte: é bem possível que quem queria tirar a Dilma, quem queria
destruir a Petrobras, também tinha interesse em destruir as empresas de
engenharia brasileira. Porque você pode perfeitamente bem fazer um processo de
investigação, descobrir a corrupção, se o dono da Odebrecht praticou corrupção
você o prende, mas a empresa continua funcionando, gerando emprego e produzindo
riqueza para o país. Era isso que eles deveriam ter feito. Mas eles queriam
destruir as empresas de engenharia brasileira. A benefício de quem? Quem tinha
interesse que as empresas brasileiras não tivessem na África, não tivessem na
América do Sul. Não eram as empresas da Nicarágua. Não eram as empresas das
ilhas Seychelles. Eram as empresas americanas e dos países europeus. Eu lembro quantas vezes o rei Juan Carlos de
Bourbon falava comigo para empresas espanholas entrarem no Brasil. Mas não
deixava nenhuma brasileira entrar lá. Então não venha com essa hipocrisia.
A Odebrecht foi uma grande empresa de engenharia, a OAS, a Camargo Correia. Se
cometeram erros não foi a empresa, foi o dono, então eu pego o dono e deixa a
empresa funcionar. Imagina se um delegado comete um erro aqui na Polícia
Federal e eu fecho a Polícia Federal. Eu tenho que punir o delegado. Então, o
Brasil estava sendo respeitado no mundo. Aí eu de vez em quando fico pensando,
a Odebrecht fez o Aeroporto de Miami. Os americanos entraram com um processo
porque quem estava construindo em Cuba não poderia
construir em Miami. E a Odebrecht ganhou na justiça dos Americanos. Eu fico me
perguntando quem tinha interesse de destruir as empresas de engenharia
brasileira que estavam trabalhando no mundo. Era o Lula? Não. Era você? Não.
Era o Dallagnol? Ele nem sabia que essas empresas existiam. Ele é um pau mandado do Departamento de Justiça
americano, do Ministério Público americano. Esse é o dado concreto.
E essa aliança que o Bolsonaro está procurando com o Trump, vai ajudar o
Brasil?
Não. Não vai ajudar o Brasil. O que vai ajudar o Brasil é o Brasil ser
dotado de autoridade com moral, com caráter, com dignidade, com pessoas que se
auto respeitem. Eu tô achando bom o Moro ser ministro porque que cada vez que
ele abre a boca é um desastre. O cidadão que tirou um diploma de advogado, fez
um concurso, virou juiz e aprendeu a decorar o código penal, acha que sabe
fazer política? É preciso muito. Por isso nós estamos aqui nessa parada e
lutando para que o Brasil sabe volte a ser grande, para
que o Brasil volta a ser um povo sonhador.
Você recebeu visitas aqui, como o Martin Schulz, do Partido Social
Democrata alemão, o que significam essas visitas para o senhor?
Significa que valeu a pena construir essa relação de amizade que eu
construí no mundo inteiro. Ele veio ser solidário comigo. É uma figura que eu
gostava antes, gostava agora. E é sempre gratificante você saber que tem muita
gente honesta e de caráter no mundo. O fato do Schultz ter vindo ao Brasil, e
ter vindo aqui me visitar é muito significativo para mim. Aliás, eu vou te
contar uma história. Eu tenho com a Alemanha uma coisa engraçada, porque o
primeiro chefe de Estado alemão que me recebeu foi o Helmut Schmidt em 1980, eu
estava cassado pelo regime militar, afastado do movimento sindical, os
militares não queriam que ele me recebesse. E ele fez exigência me receber no
hotel em São Paulo e por isso eu sou muito grato. Grato a homens que não tem
medo. Depois eu tive uma relação muito grande com o movimento sindical alemão.
Tive uma boa relação com a Angela Merkel, com o Schoreder, não tive com o
Helmut Kohl.
ô-XENTE, CUIDADO, pois
as palavras na cor vermelha constam
originariamente no texto, mas os destaques e ênfases são deste BLOGUEIRO.
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