Turma Marielle Franco, do
Instituto Rio Branco, expõe o rosto do golpe: homens, ricos e brancos

Formatura
de diplomatas celebra Marielle. E constrange o governo e o golpe
Na presença de Temer e Aloysio Nunes, e em tempos de crimes e prisões
políticas, orador cita Luther King e manifesta indignação de todas as forças
políticas amantes da democracia.
A formatura da turma 2016-2018 de diplomatas do Instituto Rio Branco,
celebrada na última sexta-feira (20), Dia do Diplomata, prestou contundente
homenagem a Marielle Franco.
A turma foi batizada com o nome da vereadora do Psol do Rio de
Janeiro, executada a tiros em 14 de março, junto com o motorista
Anderson Gomes, que a acompanhava.
A lembrança de um crime político contra uma liderança feminista negra,
que comoveu o mundo e ainda não foi esclarecido pelas autoridades, constrangeu
alguns presentes “ilustres” à cerimônia realizada no Palácio do Itamaraty, sede
do Ministério das Relações Exteriores: o presidente Michel Temer, responsável
por uma intervenção militar tido como desastrosa no Rio de Janeiro, e o
ministro titular da pasta, Aloysio Nunes Ferreira.
O orador da turma, Meinardo Cabral de Vasconcelos Neto, conseguiu
discreta e indiretamente provocar constrangimento, ao citar em
seu discurso de sete minutos o líder da luta pelos direitos civis nos
Estados Unidos, Marthin Luther King, na abertura de sua intervenção.
“É sempre o tempo certo de fazer o que é certo. Essas foram palavras de
Martin Luther King, preso, em Birmingham, Alabama, após organizar passeatas de
resistência contra a discriminação racial. A turma Marielle Franco – e Marielle
lutou também contra variadas formas de segregação – escolheu prestar esta
homenagem porque entendeu que era certo. E havia de ser também o tempo certo.
Nós tivemos de escolher prestá-la, é verdade, quando quase nada estava
esclarecido – e muito resta, infelizmente, por esclarecer”, declarou
Vasconcelos Neto.
“Com a convicção de que o tempo, por si, não curará nossos males nem nos
conduzirá inevitavelmente à justiça, escolhemos não nos omitir”, acrescentou,
assinalando que a indignação com morte de Marielle deve inspirar a carreira
diplomática a atuar, como ela, “como instrumentos da luta por uma sociedade
mais justa e igualitária”.
O momento em que a liderança política mais popular do país, e uma das
mais importantes do mundo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se
encontra também na condição de preso político, pode representar o segundo
constrangimento da festa.
“Na mesma ocasião (em que foi preso), Martin Luther King nos lembrava:
uma injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todos os lugares. Não
é por outro motivo que se unem hoje, com a mesma indignação, Senhor Presidente,
todas as forças políticas amantes da democracia, pois todas elas manifestaram ao
mesmo tempo consternação e solidariedade. Aqui estamos para expressar nosso
repúdio a toda forma de violência e para reforçar nossa crença nas instituições
democráticas”, acentuou o diplomata.
Desigualdade
A embaixadora Thereza Maria Machado Quintella, paraninfa da turma e
primeira mulher formada pelo Instituto Rio Branco a se tornar embaixadora no
Brasil, elogiou a escolha da turma.
Eleitora de Marielle, Thereza lembrou sua luta para a equidade de gênero
e criticou o governo pela pequena presença feminina no corpo diplomático e nos
principais postos do Ministério das Relações Exteriores de Temer – nenhum dos
12 cargos mais importantes do ministério é ocupado por mulher – como destacou o
blog Socialista Morena.
“O que mais preocupa atualmente é a ausência de mulheres na estrutura de
comando do Itamaraty. Só espero que isso seja conjuntural, e não sinal de
retrocesso”, criticou Thereza Quintella.
A turma que se formou nesta sexta tem 30 diplomatas, dos quais nove são
mulheres, como observa o blog:
Num país que tem Michel Temer e Aloysio Nunes Ferreira entre os
articuladores do golpe de 2016, a formatura de uma nova safra de diplomatas
acabou proporcionando um alentador ato de desagravo à sua tão agredida
democracia. Afinal, o golpe teve como primeira etapa requintes de misoginia, ao
oprimir e destituir por força de uma manobra jurídico, midiática e parlamentar
a primeira presidenta eleita da República. E em sua etapa presente, emprega sua
estrutura judiciária encarcerando o presidente que a antecedeu, o de maior taxa
de popularidade da história da República e potencial futuro presidente se puder
disputar a eleição de outubro. Tirar a vida de Marielle e a liberdade de Lula
se encaixa cruelmente na condição dessas injustiças “que ameaçam a justiça em
todos os lugares”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário