The
Economist, Ibope, o Brasil e o autoengano da oposição
Durante
os últimos quatro meses, o Brasil passou por um vaivém político que constituiu
a primeira grande novidade desde 2002, quando Lula destronou os grupos
políticos que governaram o país desde sempre, inclusive durante a ditadura e em
outros períodos em que viveu sem democracia. A novidade? O governo petista
sofreu imensa perda de popularidade.
Antes
de prosseguir, uma longa, mas necessária, digressão.
O
grande feito político da era Lula – que prossegue sob Dilma Roussef – tem sido
manter no poder por já quase uma década um grupo político ideológico com um
projeto político-administrativo bem definido, voltado para o objetivo maior de
resgatar a quase inacreditável – de tão grande – dívida social brasileira,
sobretudo no que diz respeito à desigualdade.
Claro
que, para chegar ao poder e operar tais mudanças, o PT “teve” que aderir a
práticas tradicionais da política.
Em
2006, o ator-militante Paulo Betti definiu bem a mudança de estratégia adotada
pelo partido em 2002, quando dobrou resistências e chegou ao poder com o
outrora “temido” Lula, que a elite, a mídia e o capital diziam que
transformaria o Brasil em uma espécie de super Cuba.
“Não dá
para fazer política sem botar a mão na merda”, disse Betti após
uma reunião de apoio de artistas à candidatura de Lula, na casa do então
ministro da Cultura, Gilberto Gil, no Rio. Criticado à exaustão pelos
hipócritas de plantão, ele se referia justamente ao que foi o mensalão:
caixa-dois.
O PT
não comprou voto algum. Só um vigarista intelectual pode afirmar que o partido
compraria seus próprios deputados, que receberam a grande maioria do dinheiro
“não-contabilizado”. Mas usou, sim, caixa-dois porque, no Brasil, sem esse
expediente ninguém vencia eleição, em 2002. Hoje, após o escândalo do mensalão,
ficou mais difícil, mas todos sabem que continua sendo usado.
Voltando
ao tema central do texto. Sob essa premissa de que os fins justificam os meios
– execrada, mas que é usada inclusive pelos seus maiores críticos, muitas vezes
sem que os fins sejam tão nobres quanto o de resgatar dívida social –, o PT
logrou operar um avanço social inédito na história do país e o tornou
resistente a crises externas.
A
queda de popularidade de Dilma após os protestos cataclísmicos de junho, porém,
animou a oposição de uma classe social, empresarial, financeira, étnica e,
sobretudo, midiática.
No
Congresso, os ratos de sempre se prepararam para abandonar o navio. A mídia,
triunfante, passou a incentivar os protestos sob a premissa de que “agora, vai”
– conseguiria, enfim, desmoralizar o governo petista e pavimentar o caminho, de
preferência, para o PSDB, mas, na pior das hipóteses, para aquela que vem se
oferecendo como a nova anti-Lula: Marina Silva.
Entre
as traições que a queda episódica de popularidade de Dilma fez surgir, a de
Eduardo Campos, governador de Pernambuco, que vem se dispondo a atrapalhar a
reeleição de Dilma em troca de se cacifar para voos futuros, porque não se
elege presidente em 2014 nem que a vaca tussa.
Pesquisa
Ibope divulgada na última quinta-feira, porém, mostra que a “morte” de Dilma
foi comemorada cedo demais. Todos os prováveis adversários – Marina Silva,
Aécio Neves e Eduardo Campos – caíram. Só ela subiu. E bem.
Contudo,
os números do Ibope só confirmam o que outras pesquisas já vinham mostrando.
Mas a oposição e a mídia, animadas com a queda estrondosa da popularidade e das
intenções de voto de Dilma entre junho e julho, continua se autoenganando.
Aécio, Marina, Eduardo Campos e a mídia vêm afirmando que está chegando ao fim
a era petista, ou lulista.
Este
analista político discorda. E muito. Por uma simples razão: o brasileiro, como
já ficou provado, não dá bola a moralismo sobre corrupção, ao votar – sabe que
os críticos do PT não têm moral pra acusar ninguém. Por isso, o brasileiro vota
com o bolso. Ponto.
E
quem diz isso não sou eu, mas o marqueteiro Renato Pereira – coordenador da
campanha eleitoral derrotada de Herique Capriles na recente eleição
presidencial na Venezuela. Ele irá coordenar a campanha tucana a presidente,
ano que vem, e, em entrevista à Folha de São Paulo na semana que finda, afiançou que o
“mensalão” não irá ajudar seu cliente.
O que
derrubou a popularidade de Dilma, em junho e julho, foi a expectativa forjada
pela mídia e referendada pelos protestos de rua de que o país estava indo para
o buraco econômico. Inflação, emprego, salários e renda das famílias não
sofreram nenhum grande baque, mas ver gente na rua quebrando tudo estimulou
parte da sociedade a crer que o barco estaria afundando.
A
114ª rodada da pesquisa CNT/MDA, por exemplo, foi a campo entre 7 e 10 de julho
e contrastou fortemente com a 113ª, levada a campo entre 1 e 5 de junho. Entre
as datas de conclusão das duas pesquisas, passaram-se 35 dias. Nesse período,
no cenário mais provável para a eleição de 2014, Dilma Rousseff perdera 19,4 pontos
percentuais, Marina Silva ganhara 8,2 pontos, Aécio Neves perdera 1,8 pontos e
Eduardo Campos ganhara 3,7 pontos.
A
aprovação do desempenho pessoal de Dilma caiu 24,4 pontos, indo de 73,7% na
pesquisa anterior para 49,3%, e a desaprovação ao seu governo subira de 20,4%
para 47,3%, uma alta de 26,9 pontos, ou 131,8% de aumento.
Já a
aprovação ao governo caíra de 54,2% para 31,3%, perda de 22,9 pontos devido,
sobretudo, ao aumento dos percentuais de ruim (que foi de 5,5% para 13,9%) e
péssimo (que foi de 3,5% para 15,6%).
A
própria pesquisa explicou a razão de piora tão acentuada no capital político de
Dilma Rousseff e de seu governo. Pioraram, então, pontos altamente sensíveis
das expectativas do brasileiro em relação ao futuro, sobretudo na percepção do que
ocorreria com o mercado de trabalho, no qual a expectativa de aumento do
desemprego saltara de 11,5% em junho para 20,4% em julho.
Nada
disso se confirmou. Na última quinta-feira, a taxa de desemprego nas seis
regiões metropolitanas pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) ficou em 5,3% em agosto, o que é considerado pelos analistas
“pleno emprego”. Como se não bastasse, o rendimento médio dos salários voltou a
subir, segundo o IBGE, indo a R$ 1.883.
Alguém
com mais de 20 ou 25 anos de idade se lembra de semelhante situação em algum
outro momento de sua vida?
Nem
todos, obviamente, estão contentes com o governo Dilma. Segundo o pesquisador
Renato Meirelles, do instituto Data Popular, informou em entrevista ao Portal
IG, os serviços mais caros e o enriquecimento das classes C e D geraram
desconforto entre os endinheirados.
O
primeiro parágrafo da matéria resume por que as classes sociais mais
abastadas sentem tanta ojeriza ao governo Dilma:
“Na
última semana, o lançamento do iPhone 5C levantou uma polêmica entre usuários
nas redes sociais. Com a Apple dedicando esforços à popularização de seus
produtos, houve quem reclamasse que os smartphones da marca, antes restritos a
uma minoria privilegiada, virariam ‘coisa de pobre’ (…)”.
Mas
não são apenas os endinheirados avulsos que odeiam Lula e Dilma por terem
colocado pobres em aeroportos, shoppings e até em universidades que, antes,
eram “coisa de rico”.
Os
banqueiros, por sua vez, estão babando de raiva com a queda dos juros comandada
pelo governo, que pôs bancos oficiais para reduzirem suas taxas, obrigando a
concorrência a segui-los – e, mesmo com as altas recentes da Selic, o
brasileiro, hoje, ainda paga juros muito menores graças à iniciativa do
governo.
Os
grandes grupos empresariais de geração de energia ou as multinacionais do setor
petrolífero estão a reclamar do “intervencionismo” do governo, que reduziu a
lucratividade das geradoras de energia elétrica e estabeleceu condições duras
para os interessados em explorar nossas imensas reservas de petróleo”.
Empresas
de planos de saúde, empreiteiras que querem explorar concessões de estradas e
tantas outras. Enfim, o capital não anda nada satisfeito com Dilma. Com
um tucano no poder seria tudo tão mais fácil para essa gente…
Nesse
aspecto, a recente capa da revista inglesa The Economist reflete justamente o
descontentamento do grande capital nacional e transnacional com o governo
“intervencionista” de Dilma. Não passa, pois, de politicagem, em parceria com o
grande capital brasileiro.
A
oposição e a mídia que lhe faz coro e que a mantém viva, assim, continuam
entregues ao autoengano que as levou às eleições de 2006, de 2010 e até de
2012. Seguem apostando no moralismo contra a corrupção e em vender a um povo
que está ganhando salários cada vez maiores, pondo filhos na faculdade e
encontrando emprego com facilidade crescente que o Brasil estaria indo a pique,
economicamente.
Não
vai ser fácil. Sobretudo em época de campanha, quando os alvos da campanha
oposicionista-empresarial-midiática terão horário na tevê para convencer as
pessoas a refletirem se vale a pena arriscar a bonança econômica vigente em
troca de moralismo de quinta e terrorismo econômico infundado.
A
oposição tucano-marinista-midiático-empresarial continua apostando em que somos
um país com 200 milhões de débeis mentais que não conseguem enxergar como as
suas vidas melhoraram. E que viram muito bem quem é quem na polêmica sobre o
programa Mais Médicos, quando a elite com plano de saúde tentou convencer um
povo que sofre com falta de médicos de que não são médicos que faltam, mas
“estrutura”, quando tantos estão cansados de ver hospitais montadinhos nas periferias
e nas cidades dos grotões que não funcionam porque não têm… médicos.
Na
mesma quinta-feira de tantas boas notícias na economia, inclusive no Jornal
Nacional, vai o PPS à TV dizer que estamos no fundo do poço e, apesar de o
mesmo PPS ser um partido cheio de denúncias de corrupção (vide o escândalo do
Cachoeira), derramando-se em moralismo fajuto “contra a corrupção”.
Ao
que tudo indica, a oposição irá à campanha de 2014, mais uma vez, para tentar
enganar o país e falar mal de um governo que, queiram ou não, tem mostrado
resultados que todos sentem em seu cotidiano, sobretudo no bolso.
O
mais irônico é que foi um conservador do campo da mídia, dos grandes
empresários, dos banqueiros e das multinacionais que melhor teorizou sobre o
autoengano. Eduardo Giannetti da Fonseca é autor de Autoengano,
livro sobre “as mentiras que contamos a nós mesmos”. A oposição
destro-tucano-marinista-empresarial-midiática deveria lê-lo.
Fonte:
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